sábado, 24 de novembro de 2012

Elaine vegetariana versus Sogra

Estou eu, lá no meu cantinho da mesa da cozinha, já pondo a última garfada na boca do prato preparado por mim, trazido de casa e no qual há pouco tinha arroz integral, berinjela, soja com cebola e alho batida no liquidificador com molho de tomate, rodelas de batata, cenoura e beterraba, -os dois últimos generosamente servidos pela sogra-, quando ela me vem com a panela e-nor-me, retira a tampa, sobe aquele cheiro que já não é mais nada familiar, e insulta:

- Ó, olha, olha! Morra de inveja do meu frango!

Fazer o quê? Tive que fingir que olhei pro frango, tadinho, morto ao molho branco. Fingir que o mau cheiro não me incomodou. Tive que ser vegetariana simpática mais uma vez. Todas as vezes, aliás, pra não ficar com fama de "cheia das frescuras."

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Se sorrir pra mim,.

Na Bienal Internacional do Livro daqui, do Ceará, tinha um rapaz segurando uma plaquinha branca que "gritava" em letras pretas garrafais, mais ou menos assim:

SE SORRIR PRA MIM AGORA, GANHA UM POEMA.

Que pressão! Não ganhei poema; não queria mesmo! Mas não me entenda mal, acho lindo poema. Apenas achei a condicional desafiante demais "pro meu gosto", como diz minha mãe. Não consegui sorrir pra ele, assim como não consigo sorrir para tantas coisas desse mundo.

Já perdi as contas de quantas vezes observei situações nada risonhas da cidade, e, que tola, sequei a lágrima contida que escapuliu, passando rapidamente as costas da mão nas maças do rosto. Ah, a timidez que dá essa emoção escancarada de uma provável manteiga (melhor margarina) derretida. A mão nervosa, "limpando" a cara, parece ordenar: "Engole o choro, menina!" Que loucura é essa de supor que a compaixão é vergonhosa?

"Que mundo feio!". Eu me envergonho mesmo é de me expressar desse jeito ao final de um papo sério. Pobre mundo, incriminado injustamente. Pobre a gente, que tira a beleza dele.

domingo, 11 de novembro de 2012

Preferencial para gentilezas

Outro dia, eu estava no supermercado e vi o caixa preferencial de bobeira. Levei meu 1kg de maças e duas goiabas até lá, mas logo uma senhora muito bem vestida e maquiada surgiu também com poucas comprinhas, no máximo, dois itens. Claro que cumpri meu dever de respeitar o direito dos mais velhos, ou melhor, dos mais experientes, cedendo a vez que não era minha.

Mas a senhora apenas olhou nos meus olhos e disse:

- Não, querida. Pode passar primeiro.

Eu não achei justa a ideia e abri caminho, pedindo várias vezes que ela tomasse minha frente. Mas a senhora, que podia ser a avó que eu nunca tive, insistiu no "Não, não! Pode ficar!". E passou a buscar uma boa justificativa pra eu não me sentir mal. Nem precisou me observar muito para, diante da minha aparência de 15 anos (mas já quase nos meus 25), tentar adivinhar meu destino:

- Tá indo pro colégio?

Então, dei uma risadinha, achando a situação e aquela senhora muito meiga e gentil. Se ainda havia alguma chance de eu convencê-la de que tinha o direito de passar na minha frente, perdi ao responder:

- Não, não...indo pro trabalho.

Ela parecia satisfeita. Tinha encontrado a grande razão de ceder sua vez. Então, colocou-se no meu lugar, não no sentido de espaço, mas de empatia mesmo:

- Ah! Trabalho? Eu sei como é, minha filha. Eu sei porque eu já trabalhei! Pode passar logo, eu espero, não tem problema.

E só me deu a opção de sorrir e agradecê-la. Saí de lá pensando que ela poderia ser a presença de vó no meu cotidiano. Saí pensando também que o mundo não está perdido.

sábado, 20 de outubro de 2012

Tudo termina bem (num mundo inventado)

Enquanto tomava café, vidrada na tv que alguém ligou na cozinha, passando TV Globinho, vejo desenhos mostrando para os pequenos o medo dos porquinhos de ir pra panela (episódio da versão em desenho do Sítio do Picapau Amarelo). 

Logo em seguida, desenho da "Mônica" sozinha em casa, morrendo de fome, preparando mingau, e o gatinho aterrorizado fugindo pela casa, achando que ela ia jogá-lo na panela com água fervente. 

Mas, claro, tudo terminou bem! Ninguém tinha intenção de transformar os bichinhos em comida. 

Acho que o escritor é vegano. (:

sábado, 13 de outubro de 2012

- Tô triste!

O que fazer quando uma criança chega pra você e desabafa:
- "Tô triste"
- Mas por quê?
- "Meu pai esqueceu de trazer o 'vídeo game' " !
- Ah, pera aí...Aqui oh, joga o joguinho do meu celular (dos mais pebinhas)
E lá estava o pequeno sentadinho na cadeira, todo entretido com um joguinho de carrinho dos mais simples.

E eu fico pensando: ah, se tristeza de gente grande fosse fácil de resolver (acabar) assim!

domingo, 23 de setembro de 2012

Eu virei aquele menininho da propaganda em que ele dizia:

- Mamãe, mamãe, eu quero brócolis!

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

O que é fofo

Pois bem, o que eu acho bonitinho; sem bem que bonitinho não, já que dizem que é apelido de feio. O que eu acho fofo, pronto!

Fofo é receber uma ligação da minha mãe, enquanto estou concentrada no trabalho, analisando o que mostra a tela do computador, e ouvir ela assim:

- Oi, Filha. Vai chegar tarde hoje da aula? Quer que eu prepare uma sopinha?

Eu: - Oww...Hum, não vai por Knorr de galinha não, né?

Ela: - Não, não, o de legumes! (Aquela mãe já preparada para conviver com os "estranhos" hábitos alimentares da filha)

Eu: - Oww..Brigada, Mãe!

Cheguei às 22 horas em casa e corri pro notebook pra escrever aqui no blog, claro que com a sopa na cabeça e, principalmente, com a lembrança da ligação fofa. Então, meu pai aparece no meu quarto e dá um aviso importante:

 - Tem sopa vegana, Filha! Vou dormir. Boa noite!
( Tão lindo, falando "sopa vegana"! E pensar que, meses atrás, ele franzia a testa enquanto me ouvia falar sobre veganismo)

A sopa estava uma delícia, e eu sou nada sem esses dois.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Quem disse que não pode sair por aí amando todo mundo?

Já sentiu o coração ocupando mais espaço do seu corpo? Assim, muito além do peito ou do que chamam de espírito. Assim, descompassado mesmo!

Ah, e todos teriam mais razões pra viver. A gente experimentando distribuir amor, compreendendo que não há exagero nem exclusividade nesse sentimento do peito, da cabeça, das pernas, dos braços, - porque o amor não fica só ali, concentrado na área onde bate o coração-. Porque ele tende a se espalhar, dirigindo-se de quem o sente a um outro corpo, a uma outra alma. Melhor: a uma porção de corpos, a uma porção de almas.

E se isso é tão bom, e se isso nos faz tão bem, por que a gente não diz pra qualquer um, para um estranho mesmo:

- Ei! Eu te amo, sabia?

Será que nos mandariam para um manicômio? Ou nos chamariam de "Jesus"? Ou mesmo de impostor?

Quem disse que não podia? Quem disse que não pode sair por aí amando todo o mundo?

sábado, 1 de setembro de 2012

Por que só agora?

E eu me pergunto.
Aliás, lanço a pergunta pra ela, pra minha amiga Natália:

- Poxa, por que a gente não consegue descobrir logo a maldade que tem por trás das coisas? Por que só vim descobrir ou abrir mais meus olhos só agora?
(sobre a crueldade dos humanos com os animais)

E a resposta de uma pessoa linda só poderia ser:

- Isso tem a ver com maturidade, eu acho; tem a ver com visão de mundo, quando a gente deixa de pensar só na gente pra pensar no mundo e nos outros!

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Uma mudança assim, meio light

Sim, as pessoas mudam, e eu mudei.

Claro que muitas coisas permaneceram, como o meu apego por este blog e o meu prazer de ler e escrever. Não troquei de amigos, nem de família, nem de namorado. Não renovei meu guarda-roupa. Não mudei de profissão.

Só mudei os cardápios. Os cardápios por aí não me dão muita opção, mas eu me dou a opção de não comer mais bichinhos, nem o que deriva deles. Então, eu procuro cantos especializados. Eu faço o meu próprio jantar. Só lamento por minha mãe, que, vez ou outra, fica toda saudosista:

- Ah, ela adorava as minhas comidas!


E aí que eu não tomo mais leite de vaquinhas "felizes" de propaganda (nem de canto nenhum), não como mais farofa de ovos. Eu tô assim, "0% Lactose 0% Colesterol".

Eu deixei de ser aquela que morria pela boca; aquela magra que pensa como gorda.

Eu agora, mais do que nunca, sou do contra.

Contra sofrimento dos bichos, que pra mim são que nem gente: sentem medo, dor, frio, calor (Vegetal não tem sistema nervoso pra sentir essas coisas); contra impacto ambiental, etc e tal.

Eu sou a favor da saúde do planeta e de toda e qualquer espécie que habita nele. Eu acredito que bicho tem seus direitos.

Parece que agora já tenho mais ou menos uma ideia do que significa "você é o que come".

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Minha Religião?

Tem coisa mais bonita do que entender as razões do outro e isso resultar numa reconciliação entre pessoas incrivelmente conectadas, entre amigos(as) de verdade?

Eu não consigo não chorar de alegria com isso. Eu não consigo não ver o tal de "Deus" nisso. Essa é minha religião: a do amor, primeiro pelo outro, pra depois por mim mesma.

:)

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Quando a saudade

Quando a saudade do meu blog "3 paredes" aperta,
quando a saudade de escrever sobre coisas bobas da vida vem.
Ah, saudade!

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Um nó na garganta guardado pra mais tarde

Eu pego o copo d’água que já foi suficiente pra satisfazer minha necessidade e guardo os outros 50% dele na geladeira. Mais tarde eu posso puxar a porta da geladeira como quem tem o vício de só verificar o que tem ali dentro e acabo bebendo da água do copo de novo.

Estranhamente a água no copo parece que é reposta por conta própria, sem que ninguém dê razões físicas pra isso. Assim eu faço com a minha tristeza. Seguro as pontas evitando que ela desabafe em momentos e lugares inapropriados. Deixo pra me consumir nela depois.

Quando o nó aperta , primeiro o coração, e logo logo a garganta, é difícil desatá-lo. Ele permanece na gente, lembrando que está lá, que não tem pressa, que aguarda você se sentir à vontade pra tanto. Os ombros ficam acanhados junto aos músculos frígidos, travados como se alguém os empurrassem com plena força e para o fundo (do “poço”).

Mais uma dose de tristeza e perco a vontade de escrever meus pensamentos, e até a coragem de publicá-los; perco o interesse no bom e paciente livro a minha espera na estante, não acho graça nas canções e apenas vejo-as como trilhas do meu filme egocêntrico.

Finalmente estou em casa, entre as quatro paredes do meu cantinho, onde posso derramar todas as lágrimas que deixei pra outra hora por conveniência. Afinal, chorar em público é para os fracos. Todos nós somos orientados a não expormos nossas fraquezas numa praça. Por que eu colocaria meu desapego numa vitrine pra todo mundo ver? Escondo meus escombros. Assim, posso, enfim, desmoronar - protegida por quatro resistentes paredes de tijolos, já que as minhas já eram.

Ah, e se fosse só choro. O nó aperta mais e falta oxigênio no coração que, às vezes, parece parar ; suas batidas rotineiras já não fazem mais batuque em nossa vontade de ser o que estamos nos tornando.

É, todo mundo canta “ Meu mundo caiu” vez ou outra ou mesmo com frequência. E o engraçado é que esse mundo se levanta rapidinho em grande parte dos casos, não é?

sábado, 30 de junho de 2012

Da parede alheia: resenha de Magda Frediani




Neste livro, a autora convida o jovem leitor para uma conversa encantadora sobre a arte de escrever. Nos “conselhos” cheios de poesia, ilustrados com delicadeza pelo artista plástico Eduardo Albini, a autora convida meninos e meninas, e também “jovens” de todas as idades, a se envolverem pela magia das palavras e a aceitarem o desafio de criar seus próprios textos. Ao dialogar com um escritor imaginário – que somos todos nós, leitores – Stela Maris Rezende explica que o importante é saber olhar, com emoção e respeito, todas as coisas que fazem parte de nosso cotidiano. É neste universo, feito de coisas aparentemente sem importância, que a premiada escritora mineira vai buscar a inspiração para seus textos... E ela revela um “segredo” aos seus leitores: tudo o que nos rodeia tem algo a nos dizer. Stela Maris busca também na natureza as imagens com as quais representa, de forma sutil e única, o ofício do escritor.

Uma bela forma de ensinar os jovens escritores a se debruçarem sobre as páginas em branco dos cadernos, ou sobre a tela do computador, em busca de novas histórias, participando desta eterna e mágica aventura da criação...

Catálogo da Editora Casa da Palavra, Rio de Janeiro, www.casadapalavra.com.br

Magda Frediani é especialista em Literatura Infantil e Juvenil, ensaísta e escritora

sábado, 23 de junho de 2012

Uma visitinha e, logo depois, um dilúvio.



Pouco antes do "dilúvio" repentino, um passarinho veio da janela aberta do meu trabalho e tentou se abrigar no cantinho da minha mesa. Não pude presenciar essa situação pra lá de agradável e linda, linda demais; isso porque eu havia acabado de ser convocada para uma reunião em outra sala. Mas, claro, minhas amigas e colegas de trabalho me contaram tim-tim por tim-tim, pois já tenho até fama de "passarinha", de tão apaixonada por eles.

O passarinho tentou comunicar que algo incomum estava por vir, que algo forte e devastador viria diretamente do céu para a cidade, lavando-a como quem enxágua uma calçada fazendo uso de uma vassoura nervosa. Um temporal sem sereno antes como aviso prévio, assolou nossa cidade hoje. Sabe aqueles fenômenos sobre os quais você fica se perguntando: " Quando e como começou essa tempestade num copo d'água mesmo?" Neste caso, numa cidade nada preparada para acolher (escorrer) uma grande quantidade de água ao mesmo tempo, tempestade num copo mesmo, literalmente.

Então, o passarinho tentou avisar; fez sua trajetória de voo mais improvável, entre as quatro paredes de um ambiente de trabalho fechado, quase lacrado, não fosse a janela aberta só por um instantinho.

Contaram-me que a danadinha da ave foi parar no cantinho da minha mesa, em cima das impressões, quietinha na dela, na certa fazendo dali seu abrigo enquanto o Sol era encoberto. Com certeza, sabendo que naquele lugar há o amor de quem passa o dia trabalhando, mas não deixa de perceber cada canto de pássaro entoado em várias direções.

O passarinho estava lá até que alguém resolveu fazer uma fotografia sua. Assustou-se e acabou sendo resgatado no outro lado da sala. O herói do dia, o colega de trabalho, fez da sua palma da mão uma pista de voo, dando a dica pro bichinho:

- Vamos! Voa! Vai!

Nada, nem sinal da avezinha bater as asas. Não queria ir de modo algum. Então, o colega de trabalho deixou-a no batente da janela. Ficaria ali até que a coragem de voltar pro céu sombrio, que antecede a tempestade, voltasse. Talvez não botasse fé na força das árvores contra a força da água. O passarinho só temia o que teria de enfrentar lá fora.

Quando retornei da reunião, me relataram tudo e corri imediatamente até a janela na esperança de encontrá-lo. Já não estava mais. Pena que eu é que não estava na hora para protegê-lo.

Depois da visitinha, mais inesperado ainda foi o temporal que tomou conta das ruas e avenidas praticamente o dia inteiro. Até o painel, daqueles que exibem temperatura e hora, foi ao chão, vencido pela água aos montes.

O temporal passou, só não passaram minhas preocupações: "Será que todo mundo tá bem? O passarinho também? Espero tanto que sim!"

domingo, 17 de junho de 2012

O vendedor de batatas fritas e a felicidade pelas pequenas coisas

Tem dias que preciso voltar pra minha casa, a casa dos meus pais. Preciso pegar um ônibus e ficar chateada dentro dele, ao ver alguém jogar embalagem pela janela como se fosse um ato absolutamente normal; tento falar algo, mas me calo e com ar de reprovação, balanço a cabeça pra pessoa como quem diz “ - Faça um exame de consciência, meu amigo!”

Depois de descer desse ônibus, cabisbaixa e desacreditada de pessoas como aquela, preciso atravessar a avenida e ir até a parada onde pego a topic que segue direto pra minha casa. Fico em pé esperando, esperando e ouvindo meu cansaço físico e mental falar mais alto do que tudo. Já são 22horas , e aí eu lembro que apenas enganei meu estômago na hora do lanche com algo rápido.

O vazio do estômago me incomoda, quando percebo o vendedor de batatas fritas. Resolvo ficar mais perto daquela espécie de fogão acoplado num carrinho de mão e de três rodas. Ali, do lado do ponto de venda, no sentido do vento que sopra, posso sentir o cheiro bom das batatas fritando, o cheiro da casa da minha infância, de quando eu vibrava vendo minha mãe preparando essa delícia para o almoço de domingo.

Apesar do cheirinho servindo de propaganda das batatas, não tive intenção de comprá-las, porque hoje evito frituras, elas já me fazem mal, e porque desconfio da higiene de cozinha ao ar livre. Apenas fiquei ali, sentindo o ânimo pela vida, e até pela rotina, retornar no simples movimento do respirar.

A topic me buscou, e eu cheguei feliz da vida no melhor lugar do mundo pra passar a noite e ver chegar o dia.

sábado, 16 de junho de 2012

Sobre Mar de Rosas, Alma gêmea e tampa da panela

Nós temos é que acreditar mesmo nessa história de fulaninho de tal é a alma gêmea da sicraninha ali. Sério mesmo, isso sim é sabedoria popular das mais astutas que já ouvi circular de boca em boca. Está comigo a Sorte da experiência própria que me leva a defender esse tipo de crença desse nosso povo cheio das espiritualidades.

Sabe aquelas coincidências extremamente coincidentes, em cujos fenômenos você está diretamente ou indiretamente envolvido? Pois é, não sei se com você, mas comigo sempre acontece disso: estou eu por ali, retornando pra casa à noite, depois do trabalho ou da aula ou da academia; caminhando tão borocochô em pedacinhos por conta do cansaço do dia, “muso” inspirador das constantes reflexões sobre a vida, a minha vida, da minha família, da mendiga até, logo ali na esquina, muito bem acomodada num papelão ( o que faz de mim uma reclamona sem causa, ou melhor, uma “caixa de reclamações” com porções de razões descartáveis, lá dentro, resmungando. Enquanto, na realidade, ando nadando num “Mar de Rosas”, aqui me entrego ao uso dessa expressão. Minha viagem é tanta que, diante da situação da mendiga, ali, e da miséria em geral, ponho-me a olhar as pontas de meus próprios dedos. Nesse simples gesto, quase consigo visualizar minha pele enrugada de tanto estar afogada na água cheirando à rosa do Mar de Rosas em que vivo mergulhada).

Voltando agora pra história de alma gêmea, além dessa minha sorte de ter acesso à educação, a emprego, a casa própria da família, a um quarto aconchegante, acontece de, quando no clímax do momento borocochô, no qual rola aqueles chô-ro-rôs que lavam as maçãs do rosto; enfim, acontece muito do meu aparelho celular vibrar, tocar e me mostrar na tela: “ Meu amor ligando...”ou “1 nova mensagem” dele. E toda vez que isso se repete, fico me perguntando: “ Como ele consegue adivinhar as horas em que mais preciso do amor dele?”

Quando não estou afetada por pessimismos bobos, minha primeira ocupação passa a ser o feliz pensamento nele. Eis outra frequente coincidência: a de pensarmos um no outro simultaneamente, o que resulta em: eu tento ligar pra ele, dá ocupado. Ele tenta me ligar, dá ocupado. Mas um de nós, que é menos impaciente, decide esperar e pronto! É o amor, certeza, é a tal da alma gêmea, da tampa da panela.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Escuridão de luz

Desligou quase todas as luzes pra que pudesse contemplar a escuridão tomada por pontinhos de luz azuis. Mas só podia ver as estrelas, quando as nuvens resolviam passear de mãos dadas com o vento. Deitou no chão do quintal sem frescuras, sem dar cabimento aos mosquitos. Parecia que a noite a acalentava em seu colo.

A mulher não, a menina; isso, a menina, porque naquele momento não passava de uma menina mesmo, encantada com tudo ao redor e longe de qualquer preocupação. Ali, tinha a liberdade de ser a autêntica artista que aparentava ser.

Cantou feito uma cigarra maluca, como se tivesse apenas aquilo para fazer pela eternidade. Escreveu feito um poeta inspirado. Dançou uma dança esquisita, metade sambista, metade bailarina. Desenhou feito uma desenhista inventiva a cruz que as quatro estrelas tentavam formar no céu; ah, era fácil pra ela, bastava ligar os pontinhos, conectar as estrelas. E ainda interpretou feito uma atriz de teatro numa tela de cinema. Como a menina conseguia? Simplesmente ela podia, sua espontaneidade permitia tudo aquilo.

Cigarreou, brincou com as palavras, bailou, ao mesmo tempo reverenciando cada ponto que piscava sobre o véu negro. Não havia nela pretensão de ser uma daquelas estrelas. Sabe que ninguém brilha como elas. Na verdade, sempre contou com elas para não se apagar como gente no universo.

Deitadinha sob os astros que habitavam a escuridão, sentiu que, se pudesse, ficaria ali para sempre, afinal, tinha forte atração pelo contraste do azul estrelar sobre o preto da meia-noite.

Esperou, desejou que aquela noite durasse por um bom tempo, até que viesse o Sol despertado pelo cantoria e algazarra dos pássaros.

terça-feira, 12 de junho de 2012

Um capítulo que seja.

Concentrar-se em histórias contadas em livros não significa que você ignora e deixa de refletir sobre sua própria vida e a de quem você ama. A mente de um leitor está sempre martelando as xis possibilidades de escrever e reescrever aqueles capítulos cruciais de sua desafiante história real.

Leitura não é abstração, não é fuga da realidade e, definitivamente, não é mero passa-tempo. Ler é um exercício diário que deixa o indivíduo com um pé no chão e o outro levitando.

Vamos ler, ter disciplina nisso. Que tal criar com carinho esse hábito todo santo dia?! Um ou dois capituluzinhos por dia,que seja, faz um bem danado!

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Quando gente do bem chega perto.

O entregador na moto, que tem Bob Marley estampado na camiseta, com certeza, é um cara legal;
A mulher que seria apenas uma "estranha", se não fosse o "bom dia", o sorrisão simpático dela, a conversa comigo sobre o noticiário na TV, como se fôssemos amigas de longa data, é uma mulher alto-astral, comunicativa e cheia de benevolência;
A moça, que há muito tempo atrás deu de cara com minhas lágrimas no ônibus e me perguntou se eu tava precisando de ajuda, é uma moça com vontade de fazer o bem, olhando bem a quem.

Esses e muitos outros tipos de pessoas semelhantes, podemos, sim, viver encontrando-os por aí. Bem aventurado é a gente, que percebe essa gente do bem a quilômetros de distância; e faz de tudo pra quebrar essa distância.

terça-feira, 22 de maio de 2012

Papel de Pai

- Pai, tô tão feliz com meu blog!

Então, ele me pergunta novamente o que seria um blog; e de novo, já perdi as contas, eu tento explicar, do jeito mais entendível que posso, o que é essa "modernidade", - no ponto de vista dele -.

Essa situação sempre acontece em outros aspectos, já que a realidade vivida pelos filhos é sempre diferente daquela dos pais. Acho que é por isso que, mais à frente, quando tivermos filhos também, chegaremos mais ou menos perto de entender nossos pais, de nos colocarmos em seus lugares. Talvez só assim daremos razão a eles, ou, ainda assim, talvez não, confusos e birrentos que somos.

Mas, sem dúvida, tudo o que nossos pais falam é único e exclusivamente para o nosso bem; "Para nossa alegria!".

Brincadeiras à parte, precisamos admitir que Mãe pressente quando algo vai bem ou não, e que Pai, ao ouvir nosso recado de saída pra encontrar os amigos ou namorado, faz muito bem em chamar pelo nosso " Juízo!". E para que eles fiquem um pouco tranquilos, temos de ser bem convincentes, lembrando-os de que o tal Juízo permanece muito bem acomodado em nossa caixola.

Então, depois de expressar, com meu jeito bobo de ser, o orgulho e carinho pelo tresparedes.blogspot.com; e depois de traduzir pra ele meu vocabulário de internauta (blog! post!), o Pai, que amo de montão, me responde assim:

" - Tá ganhando quanto com isso, Filha?"

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Pessoas, Livros e Canções

Há qualquer momento, pode está certo, será postada aqui mais uma lembrança de infância. A minha caixinha de memórias mais parece um baú aberto, sempre com a tampa escancarada. Eu vou até ele e às vezes nem me dou conta que já fui lá revirar alguns itens simbólicos. As pessoas costumam contemplar retratos. Já eu faço isso raramente, porque minhas recordações já se fazem muito vivas. Desse jeito, eu nem preciso de fotografias para me transportar para a época tal, situação tal, sentimento tal qual do momento relembrado.

As coisas e fatos recordados passam como um filme projetado dentro de mim, não como imagens rapidamente sequenciadas e envelhecidas pelo tempo, e sim lentamente e de forma clara e atual numa resolução quase perfeita, se não fossem algumas cenas embaçadas em que não consigo visualizar rostos e lugares bem definidos.

Não só de imagens são feitas as minhas lembranças. Coleciono diálogos da vida real e das vidas contadas nos livros. A minha história nesse mundo de nosso Deus e povo é permeada de trechos de canções com os quais me identifico. Assim como se encontram lá na linha do tempo do Facebook, essas letras, notas e tons ficam registrados em mim, chegando até mesmo a compor meu caráter. Meu pai comenta um tanto abismado que eu conheço todas as músicas da face da Terra, que eu só sei viver o tempo todo ouvindo música. É, quanto a essa última afirmação não acho que seja exagero dele não, mas, quanto à teoria de que conheço todas as músicas, é humanamente impossível.

Com isso, todo dia eu aprendo algo com composições musicais alheias e com os livros e com as pessoas conhecidas e anônimas e com meus próprios deslizes, enfim, com as muitas coisas da vida. Coisas que me rodeiam e que rodeiam os outros. Observo esses outros enquanto caminho na rua ou em pé na parada de ônibus ou da janela do veículo. Fico curiosa com suas histórias de vida. Não quero saber o que eles fazem, suas profissões; quero saber como eles são, se são severos, sensíveis, sinceros. Se são pais, avós, noivos. Se são o que os outros querem que eles sejam ou se puramente eles mesmos. Penso que essas pessoas todas dariam bons personagens de um Romance ou inspirações para poemas.

Dia desses, peguei a carona matinal do meu Pai. Ele parou no sinal. Mesmo mal acompanhada pela sonolência acomodada comigo no banco, percebi o sorriso do senhor moreno de bigodinho branco. Ele não sorria pra mim; sorria pra vida. Comentei dando uma risadinha:

- Olha, pai. Acabei de ver um senhor todo sorridente a essa hora.

Notei que meu pai tem o mesmo hábito de observar gente, quando ele respondeu:

- Ah, sim. Ele fica nessa avenida o dia todo. Agora ele está ali, porque tem sombra lá. Mais tarde, ele vai estar em frente a um barzinho, em pé. Ele muda de posição de acordo com a localização do Sol. Ele passa o dia assim, sem nada pra fazer. Com certeza é aposentado e não gosta de ficar em casa. Aí ele vem pra cá, acompanhar o movimento. Fica olhando os carros passando...

Meu pai observou isso tudo dele e eu só consigo me perguntar até agora, curiosa como sou: " Ele estava sorrindo ao pensar em algo? Pensando em alguém? Achando algum motorista engraçado? Notando alguma situação divertida que não consegui ver com ele?"

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Faça uma blogueira feliz!

E lá vem a "blogueira" com as histórias do cotidiano dela de novo! Sério, já duas pessoas me abordaram me chamando de blogueira.

Sou blogueira mesmo nos tempos livres que me restam. Quando não estou de férias do trabalho, o tempo que usufruo com afinco é geralmente da meia-noite até uma e meia, duas da manhã. Não que o tempo seja generoso comigo só a partir da meia-noite, mas, não sei explicar, minha cabeça parece que fica a todo vapor de madrugada, quando eu já deveria ter sumido com todos os carneirinhos, quando meus neurônios já deveriam estar se esbaldando no travesseiro velho, mas aconchegante.

Fico aqui, escrevendo, escrevendo, e quando lembro que existe contagem de tempo nesse mundo, quando penso que no dia seguinte será difícil esconder as olheiras e o cansaço mental, já é tarde demais. E o pior é que não vejo mal nenhum nisso, simplesmente porque enquanto estou aqui, invertendo orações, tentando organizar a ordem dos pensamentos, criando comparações de um diferente simples, procurando colocar as vírgulas nos lugares certos, duvidando do meu conhecimento do significado das palavras; enquanto isso tudo, juro, posso dizer que sou uma das criaturas mais realizadas desse mundo.

Se interessar ao meu leitor, o processo é mais ou menos assim:

1) Penso em alguma coisa, qualquer coisa. Hum..isso seria interessante compartilhar, quem sabe?;
2) Ah, tem isso que poderia. Pensando melhor, não, não, muito pessoal; deixo só no word mesmo, na pasta " Meus textos";
3) Essa outra situação aqui é que merece ser contada;
4) Esqueço que existe papel e, mesmo que eu quisesse escrever à mão, perdi o hábito de sempre deixar caneta na bolsa. Não faço ideia de onde encontrar uma caneta em casa;
5) Vou decidida fazer login no Blogger. Em seguida, " Nova postagem";
6) Eis que vem o pensamento: " Será que vale a pena mesmo?" "Será que vou fazer o bem a alguém com esse texto?"
7) Finalmente, começo a "costurar" palavras. Vou analisando fio por fio e desconfiando a todo momento do meu vocabulário, da ortografia.

São constantes as visitas ao Dicionário da língua portuguesa. Fico feliz quando Ele quase diz pra mim:

- Você estava certa. É assim mesmo que se escreve, garota!

Embora haja todo esse esforço, não ponho minha mão no fogo quanto à assertividade das coisas que escrevo aqui. A Língua Portuguesa tem seus segredos e armadilhas, por isso sou tão seduzida por ela.

8) Depois dessa costura toda e dessa desconfiança de conhecimentos, a maior alegria é clicar no " Publicar", compartilhar o link e esperar.

Então, a segunda maior alegria é verificar o "Painel" e vê escrito lá " 1 comentário". Isso porque a troca de experiências é um dos maiores presentes para quem escreve e para aquele que lê.

E pra finalizar de vez mais um texto publicado, confesso que sou viciada em verificar as "Estatísticas" de visualizações.

Caso tenha interesse, leitor, aqui vai o Ranking de visualizações desde o ano em que criei o blog (Maio/2008), que já foi intitulado de " Entre Riscos e Rascunhos". São apenas "visualizações", quer dizer, não sei se é de leitura mesmo. Afinal, o internauta pode ter esbarrado na página sem querer e nem leu. Mas é melhor não pensar nisso para o bem do ego de uma aspirante a escritora(hahaha).

Eis o Ranking ( Post = nº de visualizações de página):
1º) Círculo imperfeito = 39
2º) E aí, como é = 33
3º) Vamos ver Novela e Telejornal = 26
4º) O que nem a ciência explica = 23
5º) Pai e Mãe e Filho = 21

Então, é isso aí! Faça essa "blogueira" aqui feliz: leia, comente, elogie, critique, que a gente está nessa vida mesmo é pra tentar fazer, se não muito, ao menos um pouco melhor.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

O que nem a ciência explica.

O que explica; como se explica certas coisas? Sabe, há tantos acontecimentos para os quais não há explicação óbvia e nenhuma outra.

Ontem estávamos ouvindo Led Zeppelin nas alturas. Da cozinha, a mãe falou que já era hora de dencansar o juízo. Como assim música cansa o juízo? Coisas da minha mãe. Então ela pediu que pelo menos baixássemos o volume. Bem, achei meio impossível ouvir Led Zeppelin baixinho, melhor seria desligar logo o som. Mas, não, eu resolvi reduzir o volume mesmo. De repente, depois de girar o "botão" do aparelho, baixando assim o volume, dei um passo pra trás e ao mesmo tempo algo girou o botão com uma força capaz de produzir um som assustadoramente alto. Ok, o aparelho está sem o controle, logo não era brincadeirinha de ninguém. Estávamos conversando de frente para o troço e não havia uma quarta pessoa conversando de frente para o som que nem a gente. Definitivamente não havia ninguém que pudesse contrariar o pedido da minha mãe de que ouvíssemos Led Zeppelin baixinho mesmo. Não era irregularidade de altura da própria música, e não havia possibilidade alguma do aparelho aumentar o seu volume por livre e espontânea vontade.

Enfim, não há explicações para o que aconteceu, como também não há para o fato de eu sentir às vezes, muito raramente, ainda bem, a chegada de alguém até mim. Desde criança, sinto aproximações, uma espécie de energia que emana de um corpo não identificado e invisível. Sempre espero que seja minha mãe, vindo me contar as histórias absurdas do bairro onde moramos, ou meu pai vindo conferir com certo alívio que a filha está em casa. Mas, não, não são eles nem meu irmão, são as visitas estranhas que recebo periodicamente. São presenças calorosas, de tão vivas que parecem. Movo meus olhos na mesma direção das chegadas como quem consegue enxergar silhuetas transparentes. Aí, decido não "quebrar" a cabeça com isso. Simplesmente decido não buscar explicação; e fico na minha até a sensação se esvair.

Outra vez, era de madrugada, todos dormindo e eu acordada, sentada na escrivaninha do quarto ouvindo uma música que me emocionou ao extremo. Eram letras e melodias tão incríveis, que naturalmente minhas lágrimas seguiam impacientes seus cursos ondulantes pelas bochechas e queixo. Foi então que senti o deslocamento de muita energia concentrada. Moveu-se por trás de mim e se colocou ao meu lado, na minha esquerda. Não, eu não estava tendo pesadelo; estava muito bem acordada, isso sim.

Relatei essas mesmas coisas a um amigo cético e ele concluiu que eu devo ter alguma doença. Tá, mas tenho saúde e disposição de sobra e acho que meu único "distúrbio mental" é pensar demais ou ser sensível demais com certas coisas.

Acho que meu amigo precisa entender que nem tudo a ciência explica. Nem tudo que acontece nesse plano é explicável.

domingo, 29 de abril de 2012

Colírio não!

Consultei um médico novo. Há tempos eu não retornava para saber como anda meu astigmatismo. Há tempos uso óculos. Lembro de mim minúscula como um ponto indo ao bebedouro da escola. Duas crianças mais velhas conversando, uma olhou pra mim e comentou: "Ela, tão pivetinha e já usa óculos!" Mas eu não me importei, porque nunca tive vergonha de usá-los e jamais passou pela minha cabeça usar lentes. Se eu sequer imaginar um objeto estranho entrando em olhos, tenho arrepios de agonia. Talvez por isso eu sempre dou muito trabalho as pobrezinhas das assistentes de oftalmologista. Vejo-as vindo em minha direção com colírio numa mão e um lenço de papel na outra. Essa é uma cena de tortura. Sentada na cadeira, transfiro toda minha tensão para as pernas e braços. Tenho pavor, pavor. Ela vai pedir que eu jogue minha cabeça para trás, vai derramar gotas de pimenta que ardem e deixam cegos os olhos. Com as pupilas totalmente dilatadas, oh meu pai, terei que lidar com a incapacidade de enxergar, de ler um bilhete que seja por uma duração dura demais. Dura e dolorosa como um chute numa pedra. Dói não ver as coisas direito. Também o que os olhos não veem o coração sente. Há tanta distorção nesse mundo afora, sem uma visão em perfeito estado fica difícil desviar das coisas e pessoas claramente distorcidas, que podem chegar a distorcer também o nosso caminho.

Então, não suporto colírios, até aqueles anti-sépticos. Tenho olhos sensíveis além do que se considera normal, certeza. Vivo com os olhos aguados; e se percebo o menor sinal de alagamento no olho alheio, os meus rapidamente se transformam em riachos daquele rio revelado pelo outro.

Bem, a consulta; eu sobrevivi. Sai com uma receita dentro da bolsa. Além de uma pequena alteração de grau do olho direito, a ovelha negra, porque o outro leva pouco grau, sai com uma indicação de colírio. Por que eu fui dizer que trabalhava o dia inteiro no computador? Sou sempre obediente com os tratamentos que me passam, mas desta vez não há como seguir direitinho. Pavor, terror de gotas estranhas serenando nos meus olhos. Natural é que elas brotem deles, em seguida, transbordando em forma de empatia, alegria ou tristeza.

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Acontece. Aconteceu.

Não é lorota nem invencionice nem viagem na maionese o que dizem os textos pendurados nas tais das três paredes deste blog. Não sei se por falta de imaginação, mas até o momento está fora da minha realidade contar histórias que nunca ocorreram de fato. É, meu amigo, está provada, ao menos para mim, a minha predisposição a transformar pequenos fatos reais em histórias, sejam essas divertidas ou tristes, esquisitas ou normais, frias ou sentimentais até demais.

Para mim, contar histórias por meio de palavras não ditas, escritas, é quase uma terapia, meu pão, meu ioga de cada dia. Quando não tenho sequer uma história em processo de formulação, se movendo da minha cabeça ao coração, fico tão solitária quanto um livro nunca lido esquecido na estante. Beiro à loucura de achar que a história vai bater na minha porta fardada de Correios. É claro que ela não virá assim, eu que devo ir até ela, procurando-a ou encontrando-a ao acaso. E essas histórias, prestes a serem relatadas com pitadas de impressões que deixam em mim, são povoadas de personagens que representam seus próprios papéis rabiscados pela realidade. Afinal, quem sou eu para criar uma pessoa-personagem com claras definições de personalidade e tantas outras complexidades?

Então, por enquanto, eu só consigo descrever situações que aconteceram mesmo, e que sobre as quais, por sorte, minha deficiência de memória ainda não conseguiu prevalecer. Acho que pouco antes da falta de memória vir, desnorteadora como só ela é, eu já tenho anotado aqui as ações, sensações e reações de fatos que realmente importam. Importantes a ponto de não serem tão facilmente descartados pela memória seletiva.

Essa vontade de estar sempre contando alguma história é tão inesgotável, que hoje não é a primeira nem a última noite durante a qual me pergunto sobre a próxima postagem, o próximo texto daqui. Que história vale a pena compartilhar; se vai acrescentar algo duradouro e valioso dentro de alguém que se dispor a ler.

Estava me sentindo vazia agora a pouco, e ainda estou, mas acho que esse desabafo quebrou o galho, - um pouco -. Que mania de inquietude, meu Deus! Seria desespero demais implorar:" Por favor, alguma cena bonita ou feia da vida cotidiana, se revele agora ou não aconteça nunca mesmo!" ?

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Criança também copia coisa ruim de adulto

Eu estava no meio da rua, que ainda tinha cheiro de asfalto novo, brincando de jogar vôlei com minha amiga mais velha.

A bola foi rolando pra longe. Vi o menino, que costumava brincar do outro lado da rua, passando. Pedi que pegasse a bola pra gente. Ele trouxe. Aproveitei para convidá-lo pro jogo. Espantei-me com a resposta:

- Eu não! Lá vou jogar com uma aleijada!

Ele se referiu a minha amiga assim. Ela podia dobrar muito pouco as pernas e andava com aparelhos. Isso não a impedia de jogar vôlei comigo.

Fiquei um bom tempo parada, ainda digerindo o que o menino havia dito. Assumi a vergonha que ele não teve. Ela só me aconselhou a não dar bola pro menino, literalmente. Eu aceitei. Afinal, ele podia estar só copiando os pais ou algum outro adulto. Enfim, ele era uma criança. Pode ser que hoje, já adulto, tenha uma melhor opinião formada sobre esse tipo de coisa.

E assim, desde cedo, desde criança, eu soube da existência do preconceito e da sua companheira fiel: a ignorância.

domingo, 15 de abril de 2012

Os honestos pagam pelos desonestos

Eu era criança quando fui abordada por um catador de lixo. Estacionou o carrinho de mão pesado em frente à calçada da minha casa e pediu, humildemente, que eu lhe trouxesse um copo d`água. Lembrei da recomendação de não falar com estranhos, mas sempre achei isso esquisito. Como ignorar um ser humano que se dirige a você como se ele fosse invisível?

Raciocinei rapidamente para que pudesse emitir logo uma resposta, mesmo que hesitante, afinal, eu tinha que responder algo a uma pessoa que poderia estar mesmo com muita sede. Eu já tinha senso do perigo. Então, antes de esboçar alguma reação, fiquei imaginando a cena: eu entrando pra buscar água, deixando o portão aberto, porque eu teria vergonha de fechar a porta na cara dele, com receio de mostrar a minha desconfiança e a pessoa se ofender, o cara se aproveitando da minha inocência para entrar na casa, roubá-la, ou ainda fazer algum mal a minha família.

A minha saída foi dizer que água "de beber" estava em falta. Depois, hesitei e passei a me contradizer, alegando que até tinha água, mas que não estava gelada. Ele rebateu dizendo que não tinha problema. Mas eu não arredaria o pé dali. Não diria a ele que minha mãe havia me proibido de falar com estranhos, o que implicaria também na minha impossibilidade de entregar um copo d`água. Eu fiquei falando justificativas incoerentes, até que ele se convenceu de que eu tinha medo. Medo só, porque a maldade de negar água a alguém não poderia haver numa criança.

Foi embora. Desde esse dia, nunca esqueci do meu jeito de negar água a um pobre catador de lixo. Eu me sentia uma pessoa horrível, mas sabia que tinha minhas razões para tal.

Outro dia, eu estava no canteiro central, em frente à parada de ônibus, quando outro catador de lixo, este mais novo e cheio de energia, embora já com claros sinais de cansaço, se dirigiu a mim sem implorar nem nada:

- Moça, tem alguma moeda para ajudar no meu almoço?

Senti algo apertar dentro de mim. Pude ver a imagem do primeiro catador me implorando por um copo d`água. Era uma projeção trêmula de uma cena real e triste, retrato da miséria do nosso país. Novamente, o senso do perigo e a premonição do cara arrancando minha bolsa, enquanto eu estivesse procurando a carteira. Desta vez, estive mais decidida ao dar resposta. Disse prontamente que não! E o catador demonstrou já estar acostumado com esse tipo de resposta. Conformado, retomou os braços do carrinho, tão exaustos quanto os dele, e continuou no seu caminho sem destino.

Ele foi, e eu fiquei me sentindo mais estática do que nunca diante dos sérios problemas da sociedade. Percebi que agora eu já havia negado não só um copo d`água, como também um almoço a quem tinha fome de verdade. Tudo por medo da violência e da insegurança. Quer dizer, poderiam ser pessoas honestas pedindo minha contribuição, mas que tiveram seus pedidos negados por conta da imagem suja projetada pela maioria desonesta.

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Ele dividiu com o outro a única esfiha que ganhou.

De vez em quando, esse pessoal que "olha" o carro da gente, quando paramos em algum canto, nos dá exemplos de humanidade. E melhor ainda; nos lembra que ainda há gente que pensa no outro nesse mundo, mesmo não vivendo a própria vida levada por uma maré boa.

Diante de tantas atrocidades nos noticiários, meu Deus, ainda há gente com um coração que não cabe no peito.

Essa semana fui com o namorado ao Habibi's, e o carinha avisou:

"- Pode deixar que eu olho!"

Certo, teríamos que reservar algumas moedinhas para dá-las na volta. Voltamos. Entregamos moedas e, de quebra, uma esfiha de carne. Na saída, o namorado olha pelo retrovisor, esquece que é motorista por instantes,parando tudo que está fazendo, e comenta muito surpreso:

- Olha, amor, ele dividiu com o outro cara a esfiha!

Também estava surpreendida e com uma sensação boa chegando depressa ao peito. Tive a impressão de que meu coração se derretia e ficava cada vez mais macio. Era o contágio do Bem. Meu coração se contagiou com aquela atitude altruísta. Eu precisava fazer algo. Manifestei isso tudo num pedido:

- Pega aí no pacote mais uma esfiha pra ele, pega!

domingo, 8 de abril de 2012

Mulher desapegada de certas coisas

Passei uns dias sem publicar aqui. Se você sentir minha falta e perguntar "como vai?", é provável que eu responda assim:

- Estou indo, todo dia levando nas costas uma mudinha de roupas desbotadas, dobradas de qualquer jeito, com um livro no meio.

Causo a impressão em quem me observa ou bate o olho por acaso de que todos os dias estou de mudança.

Desde depois de criança, venho me mudando. Quando menina, eu achava o máximo ganhar roupa nova dos meus pais. Minha mãe dava o toque final fazendo trança bonita nos meus fios lisos, e eu saía alegre e faceira desfilando a novidade. De alguma forma a roupinha nova me proporcionava felicidade.

Hoje não, passei a dar a mínima, quase nula importância a coisas coisificadas (materiais). Este desapego parece se intensificar com o passar do tempo.

Hoje eu mantenho certa distância dos shoppings e suas vitrines com muitas coisas que muita gente não pode comprar, mas que são compradas mesmo assim. Não que eu abomine compras sem necessidade; a economia do país precisa girar, claro, mas é que eu não consigo me encaixar em certas situações, como esta que sempre acontece comigo: estou eu entre os amigos e, como de costume, as mulheres, por afinidade, se aproximam pra bater um papo. Papo esse que acho interessante até o momento em que elas começam a falar com afeto exagerado sobre um vestido ou sapato lindíssimo que viram numa loja aí.

Aí eu olho fixo para a parede e pergunto a ela: “E aí, sou mulher mesmo?” Como não ouço resposta, me esquivo pro lado dos homens e aguardo elas voltarem a um assunto com o qual me identifico.

Acredite ou não, sou mulher que usa um só par de sapato, até o fim, até que a sola se despedace e até depois do ferrinho do salto pequeno surgir, fazendo barulho fora do comum.

Sou mulher que continua carregando uma bolsa que já dá sinais, há muito tempo, de sua incapacidade de ser exibida em público. Sou mulher vaidosa me utilizando da última das últimas gotas de corretivo líquido.

Mas, sabe, isso não faz de mim uma mulher excêntrica, nem "mulher-macho". Isso só demonstra que sou econômica e, principalmente, desapegada de tudo que não dura muito ou de tudo que não for capaz de me arrancar sorrisos ou lágrimas.

Escolho a minha Família

Feriado santo. Graças a deus, eu escolhi a família. Não só a família; escolhi ver um grilho caminhando cautelosamente sobre a água azul da piscina; tentei ajudá-lo porque percebi que ele estava querendo sair. A primeira coisa que vi no chão, uma folha morta e seca, usei para tirar ele dali, mas ele escorregou pro lado e eu só consegui molhá-lo mais. Minha mãe vendo minha preocupação, foi ajudar. Fez da sua mão uma concha e tirou-o junto a pequena poça de água com cloro.

Escolhi flagrar, assim, por acaso, um sapo grande camuflado igual pedra na beira da calçada, que estava sendo lavada pelos meus pais. Hoje, estava uma manhã muito quente e logo imaginei que ele só podia estar ali por pura esperteza, só aguardando a água da calçada escorrer sobre sua pele de sapo. Na noite anterior, nosso labrador tentou brincar com o tal sapo, mas só conseguiu fugir meio esquisito, tentando tirar algo do focinho.

Escolhi reunir a família do meu namorado com a minha e finalmente apresentar a eles a casa de sítio tão falada. Escolhi acompanhar minha mãe, enquanto ela apresentava para a minha sogra cada planta enfileirada no quintal comprido. Escolhi também ver as duas famílias interagindo num jogo de sinuca e na mesa durante o almoço.

Escolhi o canto insistente do bem-te-vi como substituto do despertador, e ouvir minha mãe imitando-o em seguida. Logo depois, optei por levantar da rede e ver o céu e o verde lá fora ainda em jejum. Escolhi ouvir meu pai perguntar se eu já tinha tomado café.

Escolhi, junto ao meu irmão, animar as noites de sexta e sábado dos nossos pais. Às 22h, vi que eles já se preparavam pra dormir, então fiz o convite:

- Vamos jogar Ludo, Damas, Sinuca e ouvir música?

E deu certo. Jogamos sinuca ao som de Queen nas alturas. Vimos meu pai finalizar uma jogada de mestre, comemorando sua vitória fazendo um solo do Queen na guitarra imaginária: o taco. Escolhi escutar o comentário feliz da minha mãe:

- Há muito tempo eu não via ele sorrindo assim.

Desta vez, escolhi passar o feriado todo com a minha família de sangue. Meu namorado até tentou me sequestrar, mas deixei ele ir e fiquei. A irmãzinha dele tentou convencer minha mãe de que eu deveria ir embora com eles, mas ouviu como resposta: "A Elaine é minha!"

Eu não queria ir e não fui, porque eu escolhi e vou escolher por mais vezes estar com a minha família de apenas quatro pessoas. Eu entendo que eu e meu irmão somos a fonte da alegria deles. E enquanto eles tiverem com a gente, eu vou doar o máximo do meu amor e da playlist selecionada por mim para animar a festa.

domingo, 25 de março de 2012

Gentilezas por aí

Eu estava esperando a topic. Chovia muito. Comprei um guarda-chuva da dupla de vendedores ambulantes. Um deles tinha que me dar o troco. Enquanto ele procurava, pressionava no seu pescoço o próprio guarda-chuva que o protegia para não deixá-lo cair. Tomei a atitude de segurar uma das pontas para ajudá-lo. Ele parecia ter bastante flexibilidade e costume de se virar sozinho, mas, mesmo assim, eu só ia me sentir bem se fizesse algo para contribuir. Eu não queria que o guarda- chuva dele caísse e ele precisasse sair correndo atrás.

Então, ele puxou meu troco de algum bolso, me entregou e agradeceu. Respondi agradecendo também. É muito mais gostoso responder um "obrigado!" com um outro "obrigado", melhor do que dizer "de nada!". Não vejo importância alguma na palavra nada, ela é tão carregada de nada.

Feita a compra motivada apenas por necessidade, continuei trabalhando minha paciência de esperar algo chegar, no caso, a topic. Aliás, acho isso um bom exercício de paciência, já que saber esperar é uma espécie de controle da ansiedade que todos nós devemos ter. Acho que é bastante digno conseguir o que se quer por meio da força de vontade, mesclada com generosas doses de paciência.

Continuava chovendo muito, quando a topic parou e abriu as portas para aqueles que estavam exercitando suas paciências. As pessoas subiam meio desajeitadas, como que fugindo de cada pingo de chuva. Percebi e ergui mais ainda o meu guarda-chuva pra poder guardá-los também, além de mim. Não dizem que sempre cabe mais um? Foi o que fiz, deixei que coubesse mais de um debaixo do meu guarda-chuva, porque a fila estava até grande e demorava um pouquinho para alcançarmos a proteção debaixo do teto do veículo. O homem à minha frente se deu conta que tinha um guarda-chuva alheio o protegendo. Olhou pra trás, me agradeceu, e eu respondi, dessa vez não com outro agradecimento, mas com um sorriso de satisfação.

Finalmente, todos subimos. Quando passei a roleta, o homem que me agradeceu já estava acomodado numa das cadeiras da frente. Olhou-me como se eu tivesse feito algo de extraordinário; vai ver ele não tá acostumado com gentilezas nesse tipo de ambiente. Mas eu não acho que isso seja raridade; basta estar atento para notar gente gentil ao nosso redor.

Nunca me esqueço do dia em que quase perco a topic. Eu passei ao estágio de perseguí-la no meio termo do andar apressado e do correr, e um senhorzinho, vendo que eu estava cheia de bolsas, bagagens e sacolas, gritou pela topic por mim. Quase ordenou que o motorista parasse pra eu subir. Eu consegui subir, mas, antes, olhei pra trás e fiz o sinal de legal, como agradecimento pelo gesto de empatia do senhor.

É, gentileza é uma coisa tão bonita, que a gente sempre se surpreende com ela e, principalmente, com quem faz ela acontecer.

sexta-feira, 23 de março de 2012

Trauma é isso?

Nunca mais quis andar, do meu jeito naturalmente apressado, por aquele caminho. Aquele do episódio que detalhei bem aqui " da primeira vez em que fui assaltada".

Aquela rua, aquela descida feito ladeira, onde eu voava deslizando de patins ou de bicicleta quando menina.

Aquela curva da esquina à direita da casa da minha infância, da adolescência reclusa, da minha adultância mundo à fora, acho que, lá, não mais e nem nunquinha na vida vou estar novamente. Ela perdeu a graça; a gracinha de quando eu caminhava tranquila por ela, às vezes sentindo doer o pescoço, de tanto estabelecer contato com a Lua por meio do olhar deslumbrado.

Estou decidida. Não apareço mais por lá. Seria isso o que chamam de trauma?

Quando volto pra casa, sempre passo em frente a essa rua, pensando " sei que é mais rápido por aqui, mas não quero encontrar com ladrão de novo não". Fico com a estranha sensação do acontecimento se repetir toda vez que eu decidir ir por ali. O ladrão vai avançar de novo na minha direção e arrancar violentamente todos os pensamentos que eu tiver pensando na hora. Vou tremer na base.

Então, ignoro aquela opção de trajeto e passo direto pela avenida principal e bastante movimentada. A calçada é muito estreita, vou pelos cantos da pista. E é dessa forma, meio insegura, que me sinto mais segura. Prefiro a infelicidade de motorista maluco vindo na minha direção a de um ladrão roubando meu equilíbrio emocional e psicológico.

quarta-feira, 21 de março de 2012

Sorte, de Coração!

Há dias que encaixei na minha carteira uma frase boba da autoria de um anônimo qualquer. Procurei a parte mais visível da pobrezinha, onde qualquer coisa que seja colocada ali atrai a atenção dos meus olhos assim que abro, mesmo que impacientemente à procura do dinheiro.

Dentro do bolso de plástico transparente fica a face do papel que contém a afirmação virada pra cima. Já as seis dezenas no verso, as quais, se apostadas, poderiam me tornar uma milionária de um dia pro outro, não têm a menor relevância.

É daquele papelzinho enrolado no "Biscoito da Sorte" dos restaurantes chineses ocidentais que estou falando. Sei que pode parecer infantil guardar esse tipo de coisa. Na verdade, eu nunca ficava com coisas do tipo, mas dessa vez achei prudente ficar e reservar num canto só ao alcance da minha visão e conscientização.

Afinal, o que tinha de tão interessante nesse papel, né? Simples: o Biscoito da Sorte sorriu pra mim e sussurrou assim:

- Você tem um coração amável e é bastante admirado.

A primeira imagem que veio à minha mente foi a do desenho de coração torto que me representa no perfil da rede social. Ganhei de presente da filhinha da minha Madrinha. Ela desenhou uma seta no rabisco pra dizer que apontava pra mim. Eu havia ganho o coração da pequena, ganhando também a responsabilidade de compreendê-lo com empatia, mesmo que interpretando errado, no início, algumas formas imperfeitas rabiscadas. Eu me tornava responsável por alimentar com carinho a demonstração de afeto dela. Eu teria que me tornar cada vez mais amável, justamente por já estar sendo amada.

E assim eu travo uma batalha dentro de mim, principalmente nas segundas-feiras ou em outros dias ruins, para que eu permaneça como o Biscoito da Sorte tentou adivinhar sobre mim. Eu procuro ter sempre um coração batendo de jeito amável no peito. Se o dia não é o meu dia, procuro me policiar para não destratar ninguém. Sei que, se eu falhar nisso, vou sentir o coração sufocar com o laço firme de uma corda áspera. Ele vai bater desritmado; vai me tirar de mim.

Se amanhã de manhã eu acordar e perceber que o dia não é meu, faço com que seja o dia do outro, especialmente do próximo. Se com isso serei admirada ou não, não importa, o importante é ser uma pessoa amável, sempre, mesmo que amanhã seja um dos piores dias para minha pessoa.

segunda-feira, 19 de março de 2012

Vamos ver Novela e Telejornal.

Aí você surge na casa dos seus pais, "dos seus pais" porque, apesar de ainda morar lá, você sente que não é mais apropriado chamá-la de sua. Afinal, são os quatro fins de semana de cada mês, juntando milhares de feriados do calendário ( exceto o Natal, por favor!) sem estar em família de sangue, mas sim entre as famílias de amizade, de namoro, do namorado, ou mesmo do trabalho.

Aí você aparece em casa, voltando do fim de semana + feriado curtidos na companhia dos amigos e do namorado. Você se materializa na sala e fala " Oi, Pai! Oi Mãe!" na maior cara lisa, lisa não, cara de pau mesmo, como se isso, sempre a escolha pelos amigos e namorado, fosse muito normal.

Quando a gente vai ficando um pouco mais velho, vai se afastando discretamente do lugar "debaixo da asa" dos pais. E quando agrava a sensação de " Meu Deus, o tempo! Passa rápido. Preciso aproveitar a vida já!", você não sai mais discretamente das asas. Chama atenção demais esse processo, já que seus pais estão sempre atentos a você. Então, eles fazem comentários do tipo:

- E as novidades, Filha? Não vai contar? Passa esse tempo todo longe da gente, e quando chega, se tranca, não vem conversar!

E aí você percebe que é o filho mais horrível do mundo! O remorso te ataca com unhas e dentes, - da mesma forma que seus pais defendem você -. Com unhas e dentes, eles viram onças mesmo.

Você fica um tempinho lá na sala de TV, onde eles sempre ficam, talvez menos pra assistir à programação da Globo e mais só pra esperar você desapegar do quarto e ir lá fazer ao menos um resumo de como anda sua vida, como foram os dias de trabalho ou de diversão, - com os amigos + namorado.

Você tinha decidido que não faz mais sentido assistir a novelas ou telejornais, mas seus pais nunca deixam esse hábito; esse hábito que se transforma em uma das formas de você se aproximar deles.

No meu caso, se eu optar pela novela, vou encontrar com minha mãe na sala. A gente, indignada, vai contestar o autor, pensar em deixar de assistir por conta dos vilões que estão dominando. Vamos também adivinhar o que é clichê de acontecer nos próximos capítulos. Eu fico impressionada com os anos de experiência da minha mãe como telespectadora de novela. Ela sempre acerta o que acontece depois, mesmo sem consultar as revistas do gênero "Minha Novela".

Agora, se for telejornal, vou encontrar com meu pai, fazendo o comentário que ele faz todos os anos:

- Olha isso! Você viu, Filha?! Coitadas dessas famílias! Que chuva devastadora!

Então, é isso mesmo. Depois de se sentir o filho mais ingrato do mundo, você decide que vai voltar a assistir às novelas sempre que puder, e também às notícias, sentado no sofá ao lado e bem pertinho do seu Pai.

Bem, se, no seu caso, seus pais não curtirem novela ou telejornal, você analisa bem quais as preferências e hábitos deles e tenta se incluir. Faça-se presente. Esteja sempre presente na vida dos seus pais, porque não é sempre que haverá essa abençoada oportunidade.

Agora eu vou, como diz minha Mãe, "desenfurnar" desse quarto, desligar isso aqui e jogar Damas & Ludos com Eles; aproveitar que não é novela dessa vez.

quarta-feira, 14 de março de 2012

A Origem da Poeira Cósmica e do Muro da Lamentação

Um dia minha mãe chegou pra mim e disse:

- Filha, você é uma Estrela. O Vigia da Rua tava demonstrando as habilidades dele com as cartas e disse pra mim: " Sua filha é uma Estrela".

Eu nunca me esqueci disso, não da habilidade maluca do tal vigia de rua que eu mal via na rua, mas da cara de orgulho da minha mãe. Imaginei logo que a declaração do cara só podia ser pura generosidade. O vigia, entediado com cochilos profundos e baratas e ratos perambulando pelas ruas, na certa, queria finalmente flagrar algo de surpreendente: uma mãe-coruja muito contente.

Vigia Cartomante (...) “Ainda mais essa!”, pensei. Não acredito nesse tipo de coisa. Pra mim, cartas só deveriam ser usadas para truques mágicos ou jogos divertidos com amigos; e não pra enganar os outros. Ainda bem que o Vigia não cobrou minha mãe pela revelação. Fiquei me perguntando quais indícios e palavras minha mãe deve ter proferido pra ele vir com uma frase poética dessas: " Sua filha é uma estrela."

Não entendi, na época e até hoje, a tal revelação tão impactante, principalmente ao me lembrar de vários momentos da vida nos quais me sinto muito mais uma reles poeira cósmica do que uma Estrela propriamente dita. Muitas vezes nem eu mesma me enxergo no reflexo insignificante de grão de poeira só visto com o uso do microscópio. Sou aquela coisinha se escondendo nas lacunas do espaço interestrelar.

Tá, não é tão triste assim; tem dias que a autoestima vem em forma de luz, é a luz prateada da Estrela que atinge a minha poeira em cheio. Aí, chove a Chuva de Prata ao redor da minha aura. Porém, enquanto a luz não se inclina na minha direção, não incide na minha escuridão, eu busco refúgio no que chamo de Muro da Lamentação, ou melhor, Muro das Lamentações. No plural mesmo, porque são múltiplas penas, queixas e infortúnios.

Esse muro é o seguinte: você constrói ele desde que se entende por gente. Desde aquele " Buá, meu brinquedo quebrou!", que hoje, na sociedade consumista, virou " Buáaáá, eu quero isso e aquilo ...e aquilo! Por que não? Eu que-roô!"

No Muro daqui funciona assim: compartilho-o sempre com os poucos, os poucos amigos. A gente abre um pequeno buraco em um dos tijolos pra poder conversar cara a cara, cada qual encostado no seu lado. A conversa, neste sentido, significa troca de lamentos. Você faz o seu amigo ouvir seu chororô pelo leite derramado e, depois que passa um pouco o soluçar, - naquela sensação boa de não ouvir sua mãe ordenando "engole o choro!"-, diz pro outro no outro lado do Muro:

- Poxa, mas eu só falei de mim até agora, né! E você?

Outro dia cheguei até minha mais nova amiga, muito especial aliás, e desabafei meu descontentamento, assim, por alto mesmo:

- É, hoje foi um dia que me senti uma ervilha, de tão minúscula diante de uma situação.

Ela, fofa como é, comentou com um “Oww” e logo se fez toda ouvidos:

- O que houve?

E assim despedaçamos o primeiro tijolo, abrimos um círculo no meio dele. Começamos a compartilhar nossos Muros das Lamentações, transformando-os em um só, cada uma do seu lado, olhando para o lado da outra através do pedaço quebrado, como quem se posiciona pra encaixar o olho no olho mágico de uma porta, como pra saber quem aperta a campainha, pra depois convidar para entrar.

terça-feira, 13 de março de 2012

Há que se ter um Diário.

Há que se ter um Diário. Você tem que sentir essa necessidade, caso contrário, há algo de errado. Embora existam aqueles momentos em que você pensa " Estou cansado de pensar. Hoje eu não quero pensar."

Há que se alimentar a mente de pensamentos sigilosos; é saudável. É preciso criar e lapidar reflexões que só pertencem a você e a mais ninguém. Nem tudo se expõe aos outros. Deixe que os metidos se ocupem um instante de se meterem com suas próprias vidas.

Dividir uma vida com alguém que se ama não implica em ter de revelar o seu Diário, lê-lo em voz alta para o outro. Há de se manter viva a sua individualidade.

Quando me refiro a Diário, este não é necessariamente aquele mini-livrinho, antes todo em branco, agora escrito à mão, pacientemente, a cada dia. Um Diário pode ser simplesmente um diário, ocupando seu devido espaço lá na nossa cabeça, cuja fábrica de concepções pode ficar a todo vapor durante 24 horas ou quantas horas durar nossa existência.

Quando completei 15 anos, eu não fiz questão de festa, eu não dancei valsa com príncipe encantado algum. Eu já tinha príncipes e sapos inventados por mim mesma. Eu fantasiava muitos amigos, quando eu não tinha nenhum. Eu me escondia na minha delicada fase da Adolescência "encabulada".

Foi quando fiz um presente que eu me daria nos meus 15 anos. Busquei várias folhas de ofício A4 no armário. Dobrei-as ao meio e montei uma encadernação. Usei lápis de cor pra pintar a capa e a contracapa. Coloquei o título: " Elaine. 15 anos." Daí em diante, eu escrevia freneticamente reflexões de moça-menina. Eu descobri o gosto pela escrita. Na agenda do Colégio, eu derramava versos sobre coisas que nem entendia. Sobre amor, paixão, Lua, Flor e Sol. Eram rimas em clichês, das quais eu logo ria quando terminava de escrever. Sim, muitas vezes eu ria do que escrevia, mas também chorava, porque as palavras não eram suficientes pra afastar a solidão um pouco de mim.

O fato é que meu Diário não chegou a ter muitas páginas rabiscadas. Um dia, temi que alguém o lesse. Eu não queria que coisas só minhas pertencessem aos outros, aos meus pais, ao meu irmão, seja lá quem fosse. Decidi rasgar o Diarinho em vários pedacinhos. Todas as letras e palavras, frases toscamente formadas, foram direto para o lixo. Entretanto, os pensamentos que eu extraía delas continuavam incrustados na minha mente; na mente de onde, se eu guardasse bem a sete chaves, ninguém poderia ler os meus segredos. Afinal, há que se ter mistérios e, com isso, despertar fascínios. Há que se ter reflexões secretas. Tudo isso é preciso.

domingo, 11 de março de 2012

Pombo no jantar

O que leva uma pessoa a ter a perversa ideia de aproveitar que atropelou um pombo mesmo e carregá-lo pra servir de prato principal ( mistura) na refeição?

Tudo bem que eu fiz um texto aqui sobre minha suspeita de que os pombos vão dominar o mundo, mas esta pessoa má, dessa história que conto, não sou eu, não! Pobrezinho do Pombo, meu Deus!

sexta-feira, 9 de março de 2012

A Dança de olhar nos olhos

Amanhã, todos os sábados, tem a aula de dança. Dança de Salão, de Samba, de Bolero, de Forró ( pé de serra, graças!). Também tem uma muito difícil: a dança de olhar fixo nos olhos do par.

Eu sempre tive dificuldades de olhar nos olhos de pessoas desconhecidas. A minha timidez se revela com tanta força, que só consigo levar meu olhar para qualquer canto do Mundo, menos para as pupilas do outro.

Com quem não conheço bem, sinto que, se eu olhar, estarei, sei lá, invadindo a intimidade alheia. Ao mesmo tempo, sinto o contrário: alguém a encarar algo que tenho, temos de mais profundo: a alma, o espírito, a aura, seja lá como for dado o nome a este boi.

O professor grita " Troca", e lá estou eu, no dois pra lá, dois pra cá, tentando me sentir confortável naquele ritmo imprevisível de olhares.

"Concentração!", me ordeno mentalmente. Par desconhecido, mas prossigo pra não perder a marcação.

E no meio do salão, eis que encontro alguém, - com quem não tenho nenhum receio de olhar bem no olho: é o meu par; aquele que chamei pra dançar juntinho alguns anos atrás. Foi este mesmo que passou e-mail, completamente empolgado, me convidando pra fazer a matrícula na aula do professor da Dança dos Famosos. Somos chiques, bem!

quarta-feira, 7 de março de 2012

Bicho Papão, que nada!

Eu tinha, ainda tenho, esquecida dentro de algum compartimento do guarda-roupa imenso, uma colcha de cama do Michey fazendo seu espetáculo em completo breu, a não ser pela luz focada no seu palco de algodão. Uma luz bem amarela, tendo ao seu redor uma tinta especial que brilha na escuridão do quarto.

Eu lembro como se fosse hoje, do menininho bochechudo, meu amiguinho bem mais pequenininho do que eu, sair correndo na iminência do choro, - depois de eu desligar a luz e fechar a porta do meu quarto pra mostrar o Mickey muito exibido, cantando sobre o palco "montado" na minha cama.

Lembro que saí perplexa atrás dele, perguntando:

- Você tem medo de escuro? Mas é o Mi-ckey!!!

Pensando melhor, hoje, acho que o pavor dele pela minha colcha "espetacular" era por achar que o Bicho Papão podia se disfarçar de Mickey.


Eu não tinha medo de Bicho Papão. Eu não tenho medo de Bicho Papão até hoje. Tenho medo de coisa pior, de coisa real.

segunda-feira, 5 de março de 2012

Derretidos

Sentada na parada de ônibus hoje, vejo um homem se derretendo inteiro num sorriso bobo. Olho na direção que ele olha com olhar que só me lembra paz, e o que vejo?

Uma neném feliz da vida, brincando de ficar em pé na barriga da mãe. Eu me derretí também. Contagiante que nem bocejar isso.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Da primeira vez em que fui assaltada

Brincando com o título do post anterior, mas falando sério agora:

Eu pensei que eu fosse noiada igual a minha mãe, mas o episódio de hoje me provou o contrário.

Eu pressenti que o carinha da bicicleta iria me assaltar em instantes. Ele até disfarçou bem. Olhava como quem não quer nada pra trás, especialmente pra euzinha aqui, baixinha e indefesa. Percebi e analisei as roupas dele; pensei: " Hum, ele tem aparência de ladrão." E o anjinho do outro lado disse:

- Olha, não julgue as pessoas assim. Isso é preconceito, hein!

E o diabinho flutuando no lado esquerdo resolveu desafiá-lo:

- Ah, é?! Então, espera. Se o cara ali olhar de novo pra trás é porque ele vai, sim, fazer maldade com a sua protegida. Espera, espera pra ver!

E o carinha, todo estiloso na sua moda de ladrão, além de olhar pra trás de novo, ainda fez mais: fez uma manobra de meia volta pra ir ao meu encontro. Freou, abandonou a bike possante no chão e disse, com as mãos embaixo da blusa:

- Tô armado. Passa só o celular, só o celular!

A minha vontade, guardada sigilosamente dentro dos meus pensamentos, era de sumir, 'pa-puf', desaparecer numa fumaça igual a do Gênio da lâmpada. Procurei o anjinho, e até o diabinho, mas eles já tinham sumido, e do jeito que eu desejava, na fumacinha branca.

Senti o sangue descer completamente e fiquei plantada que nem pé de bananeira na curva da esquina. Mas pensei na hora, que eu era mesmo uma sortuda. O cara fez questão de dizer que só queria meu celular ( meu pouco dinheiro na carteira, meus documentos e minha vida não, talvez sim, se eu não colaborasse). Quando lembrei do que eu chamava de "celular", veio uma espécie de alívio. "Já estava mesmo precisando trocar", pensei e entreguei o Motorola velho e arranhado.

O cara estava quase retornando pra bike, quando meu cérebro mandou que eu dissesse de jeito dengoso, como uma criança pedindo chocolate pro pai:

- Ow, me dá o chip! Por favor...

- Tira, tira!

- Vixi! Tá duro de sair. Tô nervosa. Tira pra mim, por favor!
( e a minha crise de riso deu o ar de sua graça. Estava morrendo de rir de mim mesma. Acho que o ladrão tinha certeza de que eu não ria dele. Por isso, não atirou.)

- É só dá uma batida no chão! Pega, pega!

Eu, nervosa com o troca- troca, quase que saía com o aparelho e ele com o chip. Mas ele, em mais um gesto de generosidade, tomou o corpo do celular da minha mão, entregando ao mesmo tempo o tão querido chip pra mim.

O que eu disse a ele?
- 'brigada, 'brigada. Obrigada, viu!

Quando estava me achando A Sortuda, os vizinhos, os benditos vizinhos gritaram da calçada:

- O que tá acontecendo aí?

Foi a hora em que eu mais temi pela minha sobrevivência. Apressei o passo pra me distanciar do "point" do crime. O ladrão saiu voando na bike e os vizinhos no carro atrás dele. Olha, eu posso até ser corajosa de pedir favores ao ladrão, mas sou fichinha perto dos vizinhos justiceiros.

No fim de tudo, eu percorri a rua da minha casa muito satisfeita com o chip na mão e com a minha vida tremendo, mas guardadinha dentro do meu corpo.

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Da primeira vez em que fui pedida em namoro várias vezes

Lembro vagamente, afinal, isso significou quase nada naquela minha história de vida que nem engatinhava ainda, que nem tinha saído dos três pontinhos de "Era uma vez...".

Eu fazia a quarta série, tinha exatamente 10 aninhos. E foi nessa atmosfera colegial, de coelhos azuis e sorridentes pregados na parede da sala de aula, que me fizeram a famosa perguntinha " Quer namorar comigo?" - mais de uma vez -.

O menino da pergunta era só um amigo meu e um "menino" mesmo, que não tolerava o título de "pivete". Queria porque queria ser o mais maduro da turma. Na certa, se encontrava numa dessas fases que há um tempo atrás chamavam de pré-adolescência. Não sei se já existe outro nome pra isso; pré-aborrecência? Não sei.

Bem, minha resposta à pergunta número 1 foi:

- Ãn?

Não me recordo se respondi isso por realmente não ter escutado direito. Acho que a ex- "Tia", a "Professora" estava na lousa tentando impor silêncio na pivetada agitada. Desconfio de que não foi só o barulho que não me deixou ouvir. Talvez ele tenha soltado a pergunta extremamente coberto de timidez; provavelmente depois de tentar "criar" coragem por um bom tempo. Então, ele falou bem baixinho. Depois do meu "Ãn?" e do meu contorcer de sobrancelhas como quem olha pra lousa e não enxerga uma palavra, ele enunciou pela segunda vez a mesma pergunta, só que agora com um pouco mais de impetuosidade:

- Quer namorarcomigo?!

Aí, neste ponto, tenho certeza que escutei direito. Não acreditei. Eu, uma criança, ciente de que era uma "menina" e satisfeita com a minha fase infância, ouvindo outra criança perguntar isso pra mim. Eu estava pasma. Só consegui improvisar outro "Ãn?", com sobrancelhas fazendo a mesma inclinação da primeira reação, mas desta vez destinguindo bem palavra por palavra pronunciada e entendendo a situação mais do que a tabuada decorada.

O pobrezinho do meu amigo, acho que, ficou incrédulo com a resposta repetida, pior do que isso, com a ausência de resposta. Poderia ter me chamado de " Môca!". Mas, não, ele preparou outra porção de coragem pra repetir pela terceira vez A Pergunta. E eu me esforcei pra encontrar outras palavras, dizendo:

- Como é? Não tô entendendo!

Finalmente, depois dessa, ele desistiu com um "Deixa pra lá". Ôh, dó! Mas tudo terminou bem. Ele continuou sendo meu amigo e, depois de um tempinho, apareceu com uma namoradinha. Encontrou alguém que estava na mesma fase dele, a da pré-adolescência apaixonada.

Nunca mais o vi e não faço ideia por onde anda. Normal, em um mundo cheio de gente, onde milhares de pessoas passam por sua vida, somem, indo além do que sua vista é capaz de alcançar; alguns desaparecem pra sempre.

Olha a barata!

Neste exato momento, faltando pouco pra meia-noite, eu compartilho o espaço do meu quarto com uma barata. Ela parece bem desperta, e digo mais, bem esperta. Ouve o barulho que minhas chinelas fazem e abre caminho, enquanto a espanto como quem tange um gato de rua, ladrão de carnes descongeladas na pia. Dou a entender que o canto é meu, e que ela não é bem-vinda. Tenho indisposição pra procurar veneno para baratas perdido dentro de casa; além do mais, lembro que isso vai deixar os ares do meu cantinho um tanto tóxicos.

Concluo, enfim, que não vale a pena aplicar o veneno na tal da barata; meu estômago não suportaria se eu fizesse o que meu irmão faz: celebra seu sentimento de vingança contra a coitada da barata, afogando-a numa piscina de “lama” mortífera ou, como frequentemente acontece por conta da pouca eficácia desses inseticidas, de “lama” da morte lenta, em que a barata pira o "cabeção" e sai por aí com suas antenas tontas e pegajosas. Também está fora de cogitação esmagar isso, pisando e esfregando no chão com a dancinha diabólica do pé.

Eu prefiro nenhuma dessas alternativas. Acho que faço parte do percentual insignificante de mulheres adultas que não manifestam pavor por baratas. Ajo tranquilamente, com uma única condição: desde que a tal da barata seja “pedestre”. Qualquer indício de um par de algo que faça aquela coisinha alçar voo, meu cérebro automaticamente ordena uma gritaria involuntária e, definitivamente, incontrolável. Apenas duas reações: o grito e o simples instinto de manter total distância, correndo. Acho até que, pra me sair de uma dessas, seria capaz de fugir pra rua só de camisola mesmo, e doar meu quarto, minhas coisas, meus livros pra tal da barata.

Então, é assim: depois de identificada como barata “pedestre”, mantenho a serenidade que me resta ao final de cada dia. Claro, penso em tomar algumas medidas pra evitar a indesejável, evitar só, porque exterminar esse tipo de “coisa” é, com certeza, missão impossível.

Eu costumo pensar no lado bom: ora, se ela está em busca de alimento para baratas, nada vai me acontecer; jamais faria parte do cardápio dessa coisinha asquerosa. E no fim de tudo, eu até me identifico com a bandida! Ela tem hábitos noturnos e eu também. Ela sai atrás de comida, eu saio atrás de algo que eu goste muito de fazer no meu raro tempo livre da semana: escrever sobre bobagens e sobre outras coisas que ficam martelando na minha cabeça. E assim como a barata, usufruo do silêncio da calada da noite e de sua irresistível solidão.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

O Morcego Invasor

Aqui, na casa dos meus pais, existe um morcego - dentro de casa. Sim, ele existe. Comprovei sua existência no mundo como morcego invasor de casas, da nossa casa só, talvez, na segunda de carnaval.

Tava de bobeira, matando a saudade de ficar em casa, grudada no sofá mais confortável da sala, quando ele se apresentou aos meus olhos. Estava descrevendo um voo da sala de jantar, passando pela cozinha, até o meu quarto; em seguida, voltando para a cozinha e para a sala de jantar. Parecia que fazia isso como de costume, como se já tivesse criado o hábito. Mas isso não foi nada normal; nada habitual a ideia de dividir um teto com um morcego de quintal. Então, é claro que entonei um grito de pavor.

Estava sozinha em casa, e só queria curtir meu momento "caseira". Foi nesse dia que eu acreditei na teoria da minha mãe. Qual a teoria da minha mãe? Bem, eu sou uma pessoa perturbada com luzes acesas sem precisão. Ela sabe disso e por isso, toda vez que vai dormir, me lembra de algo importante:

" Boa noite, filha! Ah, e não esquece que essa luz da cozinha é pra dormir acesa, porque, se não, a casa acorda toda cheia de fezes. Tem um morcego aí, que fica voando pela casa de madrugada."

Pensei que fosse só mais uma nóia da Mãe; afinal, ela é cheia de nóias e, quando encasqueta estas, não há cristão que as tire de sua cabeça dura. Dava vontade de responder: " Mãe, deixa de invenção!", mas dava só uma risadinha, seguida de um: " Como assim?!".

Tá, a teoria do morcego invasor que defeca dentro de casa funciona mesmo, é real. Tão verdadeira, quanto a solução da luz acesa. No dia que eu o vi pela primeira vez, antes, eu tinha apagado a luz da cozinha.

Imediatamente me veio à mente a cena da minha mãe falando do morcego vândalo. Imediatamente, quer dizer, depois do meu grito, corri pra cozinha e liguei a luz. Isso enquanto o labrador da Mãe me seguia, franzindo a testa numa vã tentativa de entender por que diabos eu agia de um jeito tão medroso e infantil.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Pombos com toda pompa



Tenho quase certeza de que os pombos guardam segredos sombrios dentro de seus papos salientes. Estufam o peito e passam a nossa frente. Outro dia precisei frear bruscamente. Esperei o pombo desfilar pelo asfalto esburacado com toda sua pompa. Andou com elegância o ícone da paz e também da doença, por isso também conhecido como “ rato de asas”. Para mim, mais parecem mistérios de asas com sangue nos olhos; já encarei-os e, de fato, circunda em seus olhos uma névoa avermelhada que confere ao seu olhar algo um tanto vampírico.

Eu continuava aguardando com toda paciência do mundo o pombo atravessar a avenida. Eu sabia que um de nós teria de ceder, e esse um era eu, que não representava ameaça alguma para ele. Mostrava-me sua posição de o Sr. da rua, não só da rua, aliás, do país, do planeta. Tenho quase certeza de que falta pouco para os pombos dominarem o mundo. E o pombo que apareceu no meio do meu caminho era o representante, um dos líderes da revolucionária superpopulação de pombos moradores de praças e igrejas.


Eu seguia com movimento ocular o seu andar dançante. O pescoço, povoado por penas azuis de tão negras, se estica, em seguida, recua deslizando no ar com o mesmo impulso. Parece até que decidiram ter esse tipo de andar pra zombar da gente: “Olha só a dancinha de calango que sou capaz de fazer .” Dança com o pescoço de um calango o danado. Com isso, ostenta sua habilidade observadora e furtiva. Finalmente, completou o seu trajeto e eu pude prosseguir o meu.

No outro dia, despertei de um sonho esquisito. Aqueles sonhos em cujos episódios nos perdemos e a única certeza são as sensações mais que físicas, que atravessam a pele e passam a ser sentidas também pelo nosso espírito. Aqueles sonhos em que sentimos necessidades tão fortes, a ponto de despertarmos com elas e descobrirmos que são reais.

Eu dormia no meu quarto, mas este não era mais parte da minha casa. Localizava-se agora no centro de uma praça qualquer. Era dia e os ventos anunciavam uma tempestade. Eu rolava de um lado pro outro na cama, não em busca de uma posição favorável para adormecer, mas tentando fugir de um pesadelo como muitas vezes faço: diante da ameaça de morte, simplesmente fecho os olhos, pronunciando mentalmente “vou sair daqui, vou sair daqui”, e me teletransporto, me refugio na realidade que só meu quarto é capaz de me proporcionar; nele sou inatingível, quase imortal. Meio insano se sentir imortal num mundo real, onde conseguimos ser os seres mais mortais da face da terra.

No pesadelo, o céu de nuvens tinha se transformado num céu de pombos, muitos, muitos pombos, uma intensa concentração de “ratos” voadores. Suas fezes banhavam meu corpo inteiro; eu me sentia muito imunda. Estava tão suja, que só pensava em me lavar com álcool, pois água não seria suficiente. Doenças transmitidas por pombos se espalhavam célula por célula no meu corpo. Eu estava contaminada, morte sentenciada.

Mas consegui, me utilizando do meu super poder de teletransporte, acordar na minha querida realidade da qual tanto reclamo às vezes. Não reclamo mais; minha vida é um mar de rosas e devo agradecer todo santo dia por isso.

Não sei se por telepatia, mas no mesmo dia desse terrível pesadelo, quando, nesse nosso confortável mundinho real, já planejava escrever aqui uma história sobre pombos, um amigo propôs que eu postasse uma crônica sobre o pombo viciado em fast-food, especificamente em “Burguer King”. Ele flagrou três vezes um pombo se deliciando com as batatas fritas de um desses Burguers Kings.

Então, esses pombos não são tão espertos assim, pois li que em estado selvagem eles podem viver até 15 anos, porém, nas cidades, com um cardápio nada saudável, não passam de 5 anos de vida. Não que eu esteja desejando o mal a eles, mas que isso pode ajudar no controle de natalidade, isso pode.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Chatinha, vai ver se a gente tá na esquina!

A gente pode até não saber ainda, mas é mais fácil do que se imagina enganar a Rotina, mais respeito, por favor: - Dona Rotina. Quer saber? - Chata Rotina, chata mesmo, a ponto de ser rebatizada de "Chatinha".

Sabe aquela pegadinha das velhas em que se aponta e diz: " Olha aquilo!" - só pra distrair por breve instante o seu interlocutor que parece observar e vigiar cada reação sua? Ou mesmo aquelas velhinhas gagás expressões: "Vai catar coquinho", "Vai ver se eu tô na esquina!". Quando me canso, consigo pegá-la numa dessas.

É simples, muito simples acabar com Ela. Coisas pequenas que você decide fazer são capazes de levá-la à morte súbita. Claro que a Dita Cuja ressuscita depois, porque, no fundo, sabemos que se faz necessária pra ordenar nossa programação certinha de todo santo dia. Vamos aos exemplos de coisas pequeninas com as quais enganamos a Chatinha:

- Vez por outra, desça quantas paradas antes você puder da que normalmente você escolhe. Saia andando a avenida inteira, se preciso, e vá observando bem cada detalhe das casas, estabelecimentos comerciais abandonados, ciclistas, mendigos, enfim, qualquer coisa/pessoa que você não notaria se estivesse dentro de um veículo. Mas veja se tem um Ronda por perto para previnir eventuais assaltos ou sequestros;

- Chegue ao trabalho entrando por outra portaria;

- Deixe o elevador quieto um instante e desça de escada mesmo; subir também não vai te matar sem fôlego, é só aprender a respirar corretamente: encher a barriguinha de ar e depois soltar. Importante respirar pelo nariz, a não ser que tenha crises de rinite e a única saída fica sendo respirar pela boca mesmo;

- Mude o disco, troque a música que você faz questão de ouvir "trocentas" milhões de vezes;

- Escolha o sentido inverso da cama pra dormir; ah, você pode também mudar os objetos de lugar;

- Ao invés de ir direto pra TV ver "BBB", escolha um canto mais reservado e silencioso; escolha um bom livro e comece imediatamente a ler;

- Sugira novas ideias pro seu trabalho e pra sua vida, se preciso for, suba numa árvore pra ver as coisas sob diferentes ângulos. - Um ex-parceiro de trabalho criativo me fez subir numa árvore uma vez. Levou o setor inteiro pra passear no parque depois do almoço.

E de muitas e muitas outras formas você consegue trapacear a Chatinha da Rotina, dependendo, é claro, de como são seus hábitos hoje.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Coincide o passo

É engraçada a situação que paira no ar, quando a gente vem andando distraído,focado numa só direção do caminho, e quase esbarra em alguém. Ficam os dois atônitos querendo seguir cada qual seu rumo, só que não conseguem porque coincidem o passo outra vez e de novo. Você decide investir na direita. O desconhecido pensa a mesma coisa que você. Então, você, gentil, mais constrangido do que gentil, volta atrás e escolhe a direção esquerda. E lá está a pessoa de novo, fazendo um projeto de caminho igual ao seu.

Você decide que quer acabar com isso e fica imóvel; simplesmente espera o outro decidir seu trajeto e ir embora de vez. Você está evitando um conflito chamado: coincidência de passos. Mas tem certas vezes que a gente não evita. Dá boas risadas da tal situação e decide que não vai evitar porque gostou daquilo e quer repetir.

Seria mera coincidência mesmo? Será que aquela pessoa com quem você cruzou no corredor não teria de ficar pra sempre ou por muito tempo no seu caminho? Um dia, faz quase cinco anos, permiti, sem medo algum, que meu passo coincidisse com de um rapaz. E até hoje caminhamos juntos na mesma direção. A gente se esbarra todo dia, se não pessoalmente, em pensamento.

sábado, 11 de fevereiro de 2012

Da janela de Arnaldo Antunes

Toda pessoa já é talentosa por natureza, porque você sabe usar o discurso, você fala com sua mãe de um jeito, com o policial de outro, com o porteiro do prédio de outro, com seu filho de outro. Teu discurso se adequa. Eu, na verdade, tenho anseio de, de tá o tempo todo, de certa forma, alterando a sensibilidade, a consciência das pessoas. Mas, ao mesmo tempo, tem um desejo muito da simplicidade, da naturalidade de tá dizendo as mesmas coisas que são óbvias, assim, só que as pessoas não estavam vendo sob aquele ponto de vista.

E aí as pessoas falam essa coisa da alma ser aquilo que você tem lá dentro, escondido no fundo, e não, às vezes tá na pele. E a música traz muito isso, por isso que ela faz a pele arrepiar, o pé bater no ritmo, as pessoas dançarem. Ela move a coisa do corpo.

Acho que a questão da Arte tá muito no "o como" você faz as coisas, talvez mais do que no ˜o quê" você faz. Sempre que eu vou fazer alguma canção ou mesmo escrever alguma coisa parece que eu não sei se vou conseguir. É sempre aventura, assim, e aí eu acabo dando um jeito e consigo, mas "o não conseguir" tá sempre presente; eu posso não conseguir.

O tempo todo é um contraponto de ação e repouso, de fala e silêncio, de som e silêncio. Você tem o pé e o espaço pra dar o passo, então eu tenho o vazio e o (...) e isso que faz a coisa se movimentar.

Eu gosto da coisa profana, da coisa híbrida, da coisa mestiça, da coisa suja, gosto do berro, a voz que tem o elemento do ruído incorporado. Pra mim, criar sempre foi um sintoma de bem estar, um sintoma de que eu tô alegre.

Acho que qualquer pessoa quer estar bem, né?! Acho que isso deveria ser um princípio comum a todo mundo.

Copiado do áudio do DVD/ álbum "Lá em Casa- ao vivo"

Amada jaca.

A professora alto-astral da Academia ama jaca. Não sei como ela mantém o corpo bem desenhado, mas, pelo visto, o amor que ela tem pela jaca não afeta o aspecto sarado dela. "- Eu AMO jaca!", ela dizendo com um sorriso de ponta a outra, o abraço agarrado ao saco de onde escapava o cheiro muito característico do presente dado por uma aluna.

Falou intrigada que passou o treino inteiro se perguntando de onde vinha aquele cheiro tão gostoso. Depois, se lembrou que era a jaca, a jaca que ganhou de uma aluna depois que a mesma perguntou, sem esperança de uma resposta positiva, se ela gostava de jaca. Ela não gosta não, ela ama!

A tal aluna também tinha ganho a jaca de um cliente e parece que não tinha como levá-la pra casa. A professora ficou feliz e depois fez biquinho ao lembrar que ia viajar e a jaca se estragar. Mas sua colega de trabalho sugeriu uma solução para o grande problema. Aconselhou que ela cortasse a jaca inteira e guardasse os gominhos na geladeira. A professora ficou toda alegre de novo.

Achei engraçado a professora indo embora toda feliz por causa de uma jaca. Achei também um tanto raro em dias como os de hoje, quando se encontra facilmente suco de laranja ( "caseira") com gominhos confinados numa caixa cheia de conservantes, alguém amar tanto um alimento natural, vindo direto do pé de jaca.

Lembrei da minha mãe, também uma doida por jaca, toda eufórica de alegria ao descobrir que eu estava voltando de um acampamento, carregando uma jaca pra dar a ela. A jaca que eu mesma cortei e tirei do pé.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

A Mãe jardineira que tenho

Tenho mãe jardineira; e tenho orgulho disso dela. Eu tenho mãe com quem aprendi a sentir a natureza como um ser vivo. Lembro bem, eu bem pequena questionando ela:

"- Por que aguar o jardim duas vezes no mesmo dia?" Ela, com aquele jeito dela impaciente para dar respostas, me respondeu com outra pergunta:

" - A gente só come e bebe água uma vez no dia?"

Tenho mãe que me ensinou a contemplar a beleza das flores e, principalmente, me fez entender que essas flores não são meros objetos de decoração, e sim vidas, como um coração a bater forte e vermelho no peito.

No começo desse ano, meus pais reformaram uma espécie de "jardim-garagem" daqui de casa. Uma pena quando percebi, já na metade das obras, que os antigos 50% de jardim perderiam para os 90% da nova garagem para dois carros. Eu, pasma, joguei pra ela mais uma pergunta polêmica com relação ao jardim:

" - Mas, Mãe, e o jardim? E o céu que nem dá mais pra ver daqui, - com essa cobertura toda aí de telhados! Desse jeito, nem o beija-flor volta mais aqui."

Desta vez, com paciência, ela se pôs a explicar que não iria se desfazer do jardim, que encontraria lugar para os jarros. Depois, não sei se por conta da minha indignação, ela me apareceu com plantinhas novas.

Trouxe jarrinhos com rosas dançantes e exibidas. Não se esqueceu de uns ganchos pra suspender os jarros nas colunas, já que não havia mais chão disponível. Então, me aparece meu pai como assistente daquela jardineira empenhada. Veio trazendo umas joaninhas e borboletas tão coloridas, que dão dor na vista. Estava munido de um martelo. Eles me contagiaram e me auto-candidatei a assistente. Minha função era indicar os melhores espaços sobre os quais possivelmente uma joaninha seria encontrada. Além disso, eu teria de prever as trajetórias dos voos das borboletas do nosso jardim.

Agora, as joaninhas e as borboletas estão lá, coladas na única parede do jardim sobre a qual se preservou o céu aberto e sob a qual foi mantido o estreito piso de terra com plantas enfileiradas.

Também agora está lá, um mini-burrinho de barro carregando, sem sair do lugar, dois jarrinhos floridos, um de cada lado da cela. Eu também ajudei a montá-lo. A mãe jardineira que tenho pediu que eu segurasse a miniatura de roseira, fragilmente enraizada no bloquinho de terra.

Enquanto a mãe preparava o mini-jarro do burrinho pra receber a roseira, eu segurava, eu abraçava, com certo receio, a terra com a qual a roseirinha indefesa se agarrava. Eu tinha tanto medo de deixar cair um grãozinho que fosse! Eu tinha receio de que a raiz desgrudasse da terra que eu tinha sobre minhas mãos em concha. Eu parecia uma menininha, segurando nos braços, pela primeira vez, um bebê recém-nascido bem fragilzinho. Acho que a mãe jardineira que tenho percebeu e ficou aconselhando:

- " Segura a bichinha com jeito, pra não derrubar!".

Eu me orgulho tanto da mãe jardineira que eu tenho. Achei tão lindo uma vez ela declarando:

" - Quando eu morrer, meu espírito vai estar nas florestas. Eu vou ficar vagando nos campos."

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Pra ficar de bem com você mesmo

Aqui vai uma dica; dica não, se não vai parecer aquelas revistas bobinhas com o título em cor vibrante, dizendo " Dicas e truques incríveis para uma vida mais saudável".

Na verdade, é apenas uma pequena sugestão. Eu fiz isto uma vez e foi tão bom, que amadureci a pequena ideia na cabeça pra virar postagem aqui, - pra que chegue até aquelas(acho que poucas) pessoas que fazem visitinhas rápidas ou longas às minhas três paredes.

Desta vez, não me proponho a escrever texto "filosófico" com metáforas malucas. No fundo, só me deu vontade de espalhar serenidade - essa sensação boa por aí, pra ti, leitor.

Agora, chega de enrolação que a sugestão não é nada de mais. Garanto que não vai arrancar pedaço de ninguém e nem ocupar demais seu badalado tempo.

* Mantenha sempre, principalmente durante a semana, sua geladeira abastecida de água de coco guardadinha e esperando por você no interior do coco. Deixe sempre o canudinho por perto e o dispositivo de som no ponto pra encher o ar de Bob Marley.



Faça isso e, quando você chegar em casa à noite, cansado depois do trabalho e estressado depois do trânsito, parece que vai sentir aquela carga pesada e perigosamente inflamável sair de cima dos seus ombros.

Agora, se o tempo está complicado mesmo, pelo menos uma só musiquinha do Bob Marley, dançada enquanto se toma um coco geladinho, não faz mal nenhum, vai!


" Positive Vibration"

Live if you want to live
Rastaman vibration yeah! Positive
I and I vibration yeah! Positive
I a man Iration yeah! Irie Ites
Positive vibration yeah! Positive

If you get down and quarrel everyday
You're saying prayers to the devil, I say
Why not help another on the way
Make it much easier
Say you just can't live that negative way
You know what I mean
Make way for the positive day

Cause its a new day
New time, new feeling yeah!
Say it's a new sign
Oh what a new day
Picking up.
Are you picking up now
Jah love, Jah love, protect us (Repeat)

Rastaman Vibration yeah! Positive
I and I vibration yeah! Irie Ites
Vibes, got to have a good vibe
Picking up.
Are you picking up now (Repeat)