terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Narrador-observador

Inicio mais um risco neste lugar já um tantão rabiscado. E como é divertido, prazeroso este ato, mesmo que não faça o menor sentido nessas postagens blogásticas. Apenas procuro mesclar estados de humor e espírito, e estes vêm desordenados, - aproximadamente como sou -, preencher a folha gasta.

No início predominava majestosamente o pronome "eu" , agora contemplo minha nova fase de enxergar outras pessoas sob gestos, emoções e ações inusitados. Por surgirem de fatos cotidianos não significa que não sejam fora do comum. Engraçado como apaguei várias observações antes como se elas fossem da menor importância. Estiveram sempre visíveis a mim, a qualquer outra pessoa.

É enaltecedor assumirmos com frequência a condição de narrador-observador. É como se estivéssemos contando histórias de vários gêneros simultaneamente, como se descobríssemos a forma de legendar as tão complexas emoções humanas. É realmente enriquecedor perceber em fatos simples e realísticos situações fantasiosas e tão curiosas envolvendo pessoas.

Portanto, pretendo continuar me arriscando como narradora-observadora. Essa história, espero, terá sempre continuidade; infindável com fins de mentirinha em cada parágrafo final.

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Desconcertante meio sócio-familiar

Há momentos em que você pede pra não estar em determinado lugar não determinado por você, já que outra pessoa se encarregou disso, uma pessoa bem familiar, aliás.
Há momentos em que você pede para não existir e/ou daria tudo para se transformar num desses bichinhos que se escondem em baixo da terra.

É duro ligar essas conclusões à ideia de estar reunido por pura coerção a um monte de seres não identificados com a incrível habilidade de se multiplicarem a cada segundo. Às vezes me pergunto se esses indivíduos supostamente familiares são penetras ou sou eu que ando um tanto afastada de pessoas próximas a mim perante a árvore genealógica. Com resignação, concluo que a segunda opção é a mais adequada para o caso. Atribuo grande parte da culpa a terceiros, mas também admito que não me arrisco à aproximação diante do distanciamento geográfico e sociográfico.


Quando em momentos desconcertantes, de início, adere-se à postura padrão do agradável e simpático sorriso colgate. Aí, você finge que está super à vontade diante de tanta gente que não convive há 11 meses, desde a última festinha “em família”. Claro que a simulação de se sentir em casa, como dizem, está na cara para quem quiser ver que não passa de uma fachada. A partir do momento em que você tenta puxar assunto, dizendo: “- Nossa, que calor. Esse clima hein”, você já se denunciou; e o único conforto é que você ao menos tentou sair da enrascada.

De certo, não há nada mais constrangedor ao redor de uma mesa com pessoas do que o silêncio, considerando a hipótese de que não ocorrerá nenhum barraco por parte de outra pessoa supostamente da família.

E nomes, por que temos que ter nomes próprios? Pró-prios! Mais que carência patética essa invenção de termos nomes para chamá-los de nossos. É assustador como algo tão mínimo quanto um nome possa causar tanto desconforto quando, confusamente, não o chamamos ou não o pronunciamos corretamente; ou quando numa situação sociável você apresenta alguém que você tem o nome na ponta da língua, mas o bendito teima em se restringir a ficar somente na língua e não sair verbalmente. Para evitar tais embaraços, simplesmente não deveríamos dar nomes aos próximos bebês que estiverem para nascer, talvez imagens simbólicas que fizessem as pessoas associarem de imediato à pessoa em questão: - moranguinha, como está?, a alguém muito meiga. Ou: “- E aí, onnda?!, ao surfista.


Essa época festiva de fim de ano é mesmo muito cruel ao nos colocar em apuros sociológicos. E continuo resmungando e concluindo que há desconcertantes momentos que não deveriam ocupar o espaço-tempo desse mundinho.

quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Olhar da janela urbana

Constantemente, meus olhos atentos registram imagens através da janela urbana. A miséria é tanta que não posso me manter imune.

É imensurável o número de gente que circula naquele semáforo da avenida, e posso deduzir que a maioria não se deixa seduzir pela imagem que fotografei dia desses; ela instantaneamente revelou-se em mim por meio de sentimentos.

O sujeito que ocupa essa imagem está sentado tão desajeitadamente, mais parecendo que alguém o jogou ali por desprezo. Se você passar por lá, verá - caso se permita enxergar - um velhinho no canteiro central, próximo à faixa de pedestre. Ao seu lado, sua companheira: uma cadeira de rodas tão fragilizada quanto seu proprietário; pressinto ser ela incapaz de sustentar a dor que sobrevive no vazio dos olhos do homem.

Os olhos, parte de mais destaque a ocupar o segundo plano de uma dentre as milhares de cenas soturnas da cidade ou do campo.

Na circunstância, permiti que eles ocupassem o primeiro plano. Concentrei-me em buscar o que aqueles olhos sombrios (embora de cor clara) estavam mirando e não encontrei. Pensei que eles poderiam ser cegos por vontade própria de seu dono, e até agora permanece a dúvida.

Analisando mais um ângulo da imagem, posso visualizar a mão esquerda da personificação da exclusão social. A mão permeada de sinais da velhice não está estendida pedindo trocado; parece estar conformada descansando muito quieta sobre o chão.

E minha mente sob efeitos de relâmpagos me mostrou diversas cenas que contrastavam com o momento. Eu podia ver imagens do luxo cômodo de poucos. Poucos encarcerados e invisíveis atrás dos vidros fumês de seus veículos.

Foi então que, olhando através da janela, deixei que a forte emoção cuidasse de desaguar a misericórdia, - que disputava com o coração o cantinho apertado do meu peito-. Foi o contato mais próximo que já tive com aquele e aquilo que considero Divino.

domingo, 20 de dezembro de 2009

"- Olha a á-gua e o salgado!...Olha a á-gua ..."

Devo insistir em relatar fatos curiosos ocorridos nas circunstâncias em que estou como carga humana transportável.

Como moro absurdamente longe dos lugares mais requisitados, passo a maior parte do tempo dentro de um veículo e quase a mesma duração esperando por ele.

E é à espera dele, do querido e raro ônibus, - independente da linha a qual ele pertence, sempre terá essa qualidade única de jóia rara e o hábito de se fazer de difícil quando mais se precisa dele -, que costumo ouvir o fascinante aviso persuasivo, se me permitem a ironia:


"OLHA A ÁGUA... E O SALGADO,
OLHA A ÁGUA... E O SALGADO,
OLHA A Á-GUA E O SALGADO,
OLHA A Á-GUA E O SALGADO...
"

A vendedora ambulante de cabelos longos e negros parece não se cansar. Queria eu ter tamanha obstinação. Ela está sempre a passos lentos de um lado para outro, pronunciando o mesmo imperativo com vago jeito de slogan:

"OLHA A ÁGUA... E O SALGADO,
OLHA A ÁGUA... E O SALGADO,
OLHA A Á-GUA E O SALGADO..."

Eu e as pessoas da parada somos capazes de calcular corretamente o intervalo entre uma frase e outra: Olha a água e o salgado! - [3 segundos] - Olha a água e o salgado! - [3 segundos] -; e assim se segue.

Sempre que ouço o slogan, fico imaginando a tal combinação entre água e salgado e logo me dá aquela azia em pensamento. Sábia é a química ao afirmar que água e óleo não se misturam.

Certa vez, aproveitei uma oportunidade para esclarecer uma dúvida e, fingindo estar interessada no salgado, perguntei também:
-Pra beber, você só tem água mesmo, então?!

Sim. O anúncio repetidamente irritante para olharmos para a água, que é apenas água, e o salgado, que é apenas salgado - visto que nossa vendedora poupa adjetivos aos simplórios produtos- é baseado em informação verídica. Ela realmente só vende água e salgado. Até perguntei por que não vender refrigerante também, e olha que curioso: ninguém sente falta dele. Disse ela que já tentou investir no refri e não deu certo.

A maioria dos clientes se veem levados até a vendedora para comprar só uma simples garrafinha d'água mesmo. Vai ver o calor estonteante do local faz as pessoas negarem a existência do salgado e terem a certeza saudável de que H2O é insubstituível.

Os salgadinhos, tadinhos, ficam confinados em saquinhos plásticos, se sentindo uns velhos abandonados num asilo. Se estivessem bem acompanhados, duvido que seriam desprezados.

Acho que a mulher do olha a á-gua e o salgado deveria desistir deles ou então criar uma nova categoria de casadinhos não-doces: cerveja bem gelada + salgadinhos de recheios irresistivelmente bem temperados.

Então, vai uma água e um salgado aí?!

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Comércio rosinha cruel.

O comércio quer me ver pelas costas, com toda a força da expressão. O comércio deve querer cravar uma linda faca reluzente covardemente nas minhas costas, sem que eu tenha qualquer chance de defesa. Se você acha esse comentário exagero de mente insana, peço que se situe na situação em que me encontro.

Dia desses estava eu numa sala de mulheres (qualquer sala em que só contém mulheres), e tirei a conclusão de que ser do sexo feminino seja a minha única semelhança com elas. E será que sou mesmo mulher? Mas que dúvida estúpida, sou mulher e tenho uma sensibilidade cor de rosa. Mas será que o fato de não me atrair muito por produtos rosinhas nega essas evidências biológicas?

Vou dar continuidade à descrição da situação que gerou todas essas crises existenciais.

Uma das mulheres entrou na sala exultando. Afinal, ela poderia enfim mostrar a novidade tirando-a da sacola. Eram sandálias, dessas rasteiras com um toque glamouroso de pedrinhas brilhantes. Deu um sorriso descomunal ao informar o valor super em conta e de imediato calçou um dos pares; acho que se pudesse, ela usaria os dois ao mesmo tempo.

E, falando em sandália, logo uma segunda mulher se manisfestou desabafando toda sua preocupação quanto à festa que a aguardava. Ela precisava de conselho se determinada sandália combinava com a roupa que pretendia ir. E, sinceramente, não sei que obsessão é essa de querer combinar tudo. Talvez isso exista desde o princípio do Universo. A Eva devia se perguntar se a pessoa dela realmente combinava com Adão. Caso ela julgasse que não, estaríamos perdidos, não teríamos a chance de existir hoje.

Certamente você deve imaginar que não só essas duas mulheres interrompiam o silêncio do recinto. Outra mulher criou um novo assunto. Tratava-se de seus relatos de experiências cirúrgicas anteriores e da próxima a se realizar. Por curiosidade consegui estabelecer contato, procurando entender por que as pessoas se submetem ao tira daqui coloca acolá das cirurgias plásticas. Obviamente que os motivos são infinitos, mas a razão maior não é novidade pra ninguém: ter a beleza inspirada das bonecas Barbies.

Continuei sustentando o contato apenas com interjeições comuns, como hum, ah, sério?. E cometi o terrível erro de fazer breves perguntas, o que só alongou ainda mais as falas da interlocutora, fazendo do diálogo algo chatissimamente maçante, embora tenha eu extraído parte interessante.

Quando o assunto pareceu calar, voltei ao que fazia antes: somente observar. Então, olho para o lado e vejo a consumidora feliz tirar fotos com todo cuidado para os enquadramentos das mais novas sandálias saírem perfeitos. Imaginei ela postando no twitpic para as outras mulheres ficarem por dentro da nova aquisição. Olha, não é linda? E aí daria-se a sequência de todo aquele blá blá blá novamente.

Você que se deu ao trabalho de ler até aqui deve estar pensando: Essa garota deve ter alguma anomalia! Vai dizer que você também nunca ficou alegre e satisfeita com uma compra?. Devo responder que sim, mas não, quando o produto é rosinha. Desse tipo compro raramente, e sempre em último caso, a tal ponto da sandália ou vestido quase implorarem pedindo que eu os deixe viver seus últimos dias no recanto do guarda-roupas mórbidas ou caridosamente sob o poder dos mais necessitados.

É por isso que tenho toda essa convicção de que o comércio de produtos rosados quer me apunhalar pelas costas. Ouço até uma voz rouca e voraz me chantageando:

-COMPRE ISSO AGORA MESMO OU VOCÊ SERÁ FEIOSA POR TODA A ETERNIDADE!

Ele não só ameaça, como também debocha de mim ao ofertar produtos com curtíssimos prazos de vida. Oh, céus, já sinto até a pontada da faca entrando na minha pele não melecada por milagrosos hidratantes.

Risco alheio - Marisa Monte

O Bonde do Dom
Marisa Monte

Composição: Arnaldo Antunes / Carlinhos Brown / Marisa Monte

Novo dia
Sigo pensando em você
Fico tão leve que não levo padecer
Trabalho em samba e não posso reclamar
Vivo cantando só para te tocar

Todo dia
Vivo pensando em casar
Juntar as rimas como um pobre popular
Subir na vida com você em meu altar
Sigo tocando só para te cantar

É o bonde do dom que me leva
Os anjos que me carregam
Os automóveis que me cercam
Os santos que me projetam
Nas asas do bem desse mundo
Carregam um quintal lá no fundo
A água do mar me bebe
A sede de ti prossegue
A sede de ti...

Obrigada, amor.

E quando o que é triste resolve me abordar novamente quase me sequestrando, sem a menor chance de minha devolução a quem tanto gosta de mim, o que se chama amor fala em voz suave ao mesmo tempo forte.

Como por intermédio de um milagre, ele me traz de volta sem deixar rastros para o sequestrador.

Obrigada, amor.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Os Jesuítas dos terminais

É realmente inspiradora essa vida de passageira de ônibus. Se você ler de vez em quando este blog meio 'grog' já deve ter observado que a maioria dos temas que extraio para destilá-los aqui vem dessas experiências cotidianas dos terminais de ônibus de Fortaleza - CE.

Já comentei que Riscos em Rascunhos está mais para "Diário de uma passageira contente". Sim, contente. Afinal, temos a séria tendência de rir de tudo, até dos problemas mais esdrúxulos.

Jaz logo abaixo uma observação que venho cozinhando há tempos dentro da minha panelinha que ferve sempre ao pensar:

" - Jesuuuus está voltando". Grita o profeta que migra pelos terminais de ônibus da cidade.

Logo ali, na fila em forma de serpente (dessas de jogo de celular), ele voltou. Não ele Jesus, como diz o profeta do terminal, mas ele: o jesuíta.

Sabe aquela velha história do processo de catequisação dos índios contada onde foi um dia o seu colégio? Pois é, a verdade é que essa velha história está mais viva do que nunca, tão viva que você pode respirá-la. Até você que nem lembra qual a última vez que passou por um terminal de ônibus na vida. Isso porque eles têm o poder da onipresença.

Tenho quase certeza que em toda parte eles estão com suas bíblias bem preservadas em volta de couro preto, isso sem esquecer do cheiroso e arrumadinho marketing pessoal. Os jesuítas de hoje não precisam de vestimentas sagradas, basta uma gravatinha e calça social. Eles têm como missão propagar a fé.

Não pense, internauta-leitor, que eu venho aqui para criticá-los; acho isso bonito, sério. Não generalizo. Isso é bonito porque , ao contrário de muita embalagem humana oca se anunciando por aí, eles acreditam em algo. Eles creem, e creem com tanta força que, ingenuamente esquecem de dar um alívio pros nossos tímpanos; estes um tanto sensíveis e já desgastados pela ação dos mp3 (música preferida móvel elevada ao cubo) e dos paredões de som dos vizinhos malcriados.

Resolvi teimar em ver o lado bom dos fatos, de modo que agora tenho certeza que nem todas essas figuras contemporâneas querem tirar proveito de tudo ou de toda sua boa vontade. E termina aqui mais um relato dessa talvez eterna passageira de ônibus.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Por que não redes?

No sufoco do transporte hoje ocorreu-me uma imaginação relaxante:

Por que não, ao invés de rígidas cadeiras ou pequeno espaço do chão para colocar o pé, redes! Por que não redes? Imagine só você pegando o busão do dia, subir, passar a roleta, tirar do bolso ou da bolsa uma rede de bolso. Aí você montaria em lugar disponível e ficaria ali, cochilando na matina a caminho do trabalho.

Entrariam dois novos produtos no mercado: rede de bolso e transporte público adaptado para os viajantes chegarem tranquilamente aos seus destinos sob o embalo da rede. Abriria-se vaga para profissional que teria como função avisar que a parada de cada passageiro está próxima.

E alguém tenta apagar o balão da minha imaginação sentenciando: "A ideia da rede é legal, mas diminuiria muito a capacidade de lotação dos ônibus". Então, despreocupo-me pensando que não custa nada fantasiar só o lado bom e vantajoso das ideias mirabolantes.

Humm, seria bem confortante e divertido. O veículo lá naquela inércia tola, sua rede batendo na do vizinho e você dizendo quase sonhando: Bom dia! Desculpa aí.

Seria uma brincadeira de navegantes no mar revolto.

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Que está mesmo para cair.


Não sei se é paranóia, essa criatura a ocupar o conturbado espaço de minha massa cerebral pensante. Essa coisa chamada iminência, repleta de qualidade de iminente, última palavra essa que o nosso ilustríssimo dicionário explica em pouca e esclarecedora expressão: "que está mesmo para cair". Oh não, algo vai 'realmente mesmo' cair e não se sabe de qual direção ou dimensão.

Se a velhinha vai tropeçar na escada, se alguém vai pisar no meu dedo machucado, se esse planeta vai parar assustadoramente estático. E por que tudo isso é absolutamente incessante? As sinapses, as mazelas, os passantes.

Poderia listar aqui milhões de coisas que estão quase para acontecer que não podemos prever. Seremos pegos de surpresa, como um assaltante de banco pegando carona do policial incorrupto.

E a minha querida iminente está sempre martelando na minha cabeça, se propagando em ecos surdos.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Uma vozsinha aqui.


Que bom essa minha necessidade de transporte público. Sempre tenho boas vivências e observações a fazer no interior dos ônibus. Ontem mesmo pude contemplar uma projeção do que sempre pensei ser.

Caminhando por meio de passos apreensivos até o meio do ônibus, pude ouvir aquela vozinha de menina cantarolando canções de sonhos. O repertório era extenso e durou quase a viagem inteira.

A menina cantava em alto e bom som, sem medo de qualquer recriminação dos adultos que a cercavam. Estes sim, ao contrário do que se pensa, não se sentiram incomodados pela "rádio" da menina.

O repertório era assim: começava com aquelas canções comuns de natal, e depois partia para aquelas cantadas no 'jardim 1' em formação de filinhas no estilo trenzinho da alegria. Foi assim até que a vozinha sofreu uma interrupção abrupta e a pequena cantora disse em tom tranquilizador:

- Calma, gente. Em 10 minutos a rádio volta com novas canções. Humm...Olha só, mal completou 1 minuto e já lembrei de mais músicas pra vocês.

E assim o som da vozsinha logo voltou a viajar pelo vento que vinha pela janela. Não me engano, tenho por mim que o ar da noite esperava ansiosamente por novas melodias pueris, quase sendo capaz de atravessar o vidro.

Ao mesmo tempo que essa situação singela me fazia esboçar um sorriso cheio de esperança e paz, logo me recordei de meu antigo costume: de cantar no chuveiro, no espelho, num cantinho só meu, em que ninguém pudesse adentrar de surpresa.

Acho que abri mão de muitas coisas que fazem eu me sentir viva: cantar, dançar, sonhar, imaginar. Hoje, me refugio dentro de histórias clássicas que me trazem a magia da infância esquecida. E essa tem sido a minha forma de ver o essencial com o coração( ideia sábia de O PEQUENO PRÍNCIPE).

Esquecendo agora um pouco de mim, volto a me lembrar da vozinha. Tive tanta vontade de pedir um autógrafo pra menininha na hora da descida do ônibus; mais uma vontade, vinda direto do pedacinho pulsante de mim, que sufoquei.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Risco alheio - O Pequeno Príncipe

"As pessoas grandes adoram os números. Quando a gente lhes fala de um novo
amigo, elas jamais se informam do essencial. Não perguntam nunca: "Qual é o som da sua
voz? Quais os brinquedos que prefere? Será que ele coleciona borboletas? "Mas
perguntam:
"Qual é sua idade? Quantos irmãos tem ele? Quanto pesa?
Quanto ganha seu pai?" Somente então é que elas julgam conhecê-lo. Se dizemos
às pessoas grandes: "Vi uma bela casa de tijolos cor-de-rosa, gerânios na janela, pombas
no telhado. . . " elas não conseguem, de modo nenhum, fazer uma idéia da casa. É preciso
dizer-lhes: "Vi uma casa de seiscentos contos". Então elas exclamam: "Que beleza!"
Assim, se a gente lhes disser: "A prova de que o principezinho existia é que ele era
encantador, que ele ria, e que ele queria um carneiro. Quando alguém quer um carneiro, é
porque existe" elas darão de ombros e nos chamarão de criança! Mas se dissermos: "O
planeta de onde ele vinha é o asteróide B 612" ficarão inteiramente convencidas, e não
amolarão com perguntas. Elas são assim mesmo.
É preciso não lhes querer mal por isso. As crianças devem ser muito indulgentes
com as pessoas grandes.
Mas nós, nós que compreendemos a vida, nós não ligamos aos números !
...
Sou um pouco como as pessoas grandes. Acho que envelheci."

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Passamos rápido.


Costumam dizer que a vida passa rápido, mas nesses últimos anos tenho notado que não é ela que vai embora sem aviso, são as pessoas. Surgem, ressurgem, desaparecem como uma mágica sem truques.

Dessas pessoas, muitas te marcam, tanto pelas suas qualidades quanto pelos seus defeitos. E por mais que a tendência maior seja uniformizar, tornar as semelhanças tão evidentes a ponto de só visualizarmos coisas, expressões, formas parecidas, essas pessoas que já passaram ou que ainda vão cruzar nosso caminho são únicas e só elas por si mesmas.

Cansei de tentar encontrar definições para o que diabos é vida.
Não precisamos alcançar isso que se chama vida, ela que se esforce para acompanhar esse nosso ritmo frenético. Uma hora somos assim, outra já não somos, nem pensamos como antigamente.

E diante de nós, a vida se vê desafiada.