terça-feira, 25 de outubro de 2011

Em movimento


Quando pus os tênis, os fones e saí por aquele portão, não imaginava que cairia em algo parecido com a toca do coelho de Alice. A princípio, eu só pensava em me aprofundar mais na onda "Geração saúde", indo além da academia a semana inteira e partindo de corpo e alma em movimento para um domingo de Sol.

Aliás, sugiro que domingo não seja só um dia pacato e melancólico em que ficamos de pernas pro ar. É injusto delegar uma função tão triste aos domingos amigos, de doces maravilhas ao lado de quem te faz uma pessoa melhor - família, amigos, amores, seja quem for, pessoas que naturalmente têm o dom de recarregar seu espírito com uma carga forte e extraordinariamene durável. Domingo deveria ser um misto de disposição e preguiça. A partir das 8h da manhã, uma boa caminhada ou corrida numa trilha ecológica pra deixar o sangue avisar a você que você é mesmo um ser vivo, com aquele sangue queimando sua face, suas pernas e tudo o mais. E depois, bem, depois poderíamos tomar uma água de côco bem gelada, almoçar e se deixar levar pelo balanço de uma belíssima rede rendada.

Mas o meu domingo não foi bem assim.

Eu saí naquele dia quente planejando caminhar apenas no limite circular da praça. Eu faria exatamente igual ao que via os outros praticarem em outras praças mais concorridas que aquela. Aquela é deserta. Aposto que ela ainda está lá a esta hora, tão solitária como sempre esteve. Se eu tenho medo de caminhar ali? Não, eu não tenho receio algum; talvez porque nunca tenham encostado uma arma em minha cabeça como fizeram ao meu pai, ou talvez porque a liberdade me encanta tanto, que perco por algumas horas meu lado racional.

Se o meu plano, desde o início, era fazer daquela praça uma grande esteira de cimento em que eu partiria de um ponto e chegaria sempre a esse mesmo ponto, vendo sempre a mesma paisagem redonda, por que eu nem sequer caminhei até ela? Eu avistei outro caminho que logo julguei ser mais envolvente que aquele. Deixei que minhas pernas fossem levadas pela minha decisão emocional. E eu sei muito bem porque desviei da trajetória circular. Eu sabia que aquela outra, disforme, se transformaria na forma que eu quisesse por meio das minhas próprias pegadas.

Passei um bom tempo caminhando sob as árvores, porque estas sim, exercem um imenso poder de atração sobre mim, é como se eu me sentisse protegida por elas. Decidi depois que seria bom experimentar como seria a tão famosa caminhada na praça. Porém, não gostei não. Senti-me avessa àquele costume. Logo, fugi da delimitação com forma de círculo. Se houver mesmo um espírito bondoso observando a gente lá de cima, com certeza deve ter visto um pontinho branco se afastando do anel cinzento da praça.

Distanciei-me da praça no exato momento em que vi o lago e um bando de pássaros negros voando sobre ele. Parti para a beira do lago. Lá a terra chega a ser tão úmida que mais parece areia movediça. Mesmo assim, ainda consegui achar um canto confortável pra sentar e observar o início da imensidão que se apresentava aos meus olhos. Pressenti que os pássaros se exibiam pra mim. Voavam tão livres eles e cantavam bem mais alto quando os vi. Mas já era hora de partir. Eu sabia que não terminava ali, que havia mais algos pra se contemplar. Algos bem maiores que eu. Acredite, eu me sentia bem menor do que já sou. Parecia mesmo que meu tamanho havia diminuído bastante, como o da Alice do País das Maravilhas, só que sem o efeito reverso, já que não tenho a menor estrutura para gigantismos.

Levantei e tentei manter o equilíbrio na terra fofa. Por um segundo, veio o medo, mas logo achei solução. Fugi da beira do lago dando pulinhos, feito pisando em ovos num campo minado. Disse um breve tchau ao lago e já nutria um outro plano. Daqueles planos que a gente deixa muito tempo martelando na mente pra encontrar o momento certo de colocá-lo em prática. Meu plano era chegar perto da Montanha de mato verde musgo. Parece que ela sempre esteve ali, ao contrário da praça. E eu queria chegar o mais perto possível, talvez na vontade de adentrar de verdade na paisagem, como entrar numa fotografia.

Mas algo me intrigou. Quanto mais eu me aproximava, mais a montanha se distanciava de mim ou eu dela. Parecia até que me desafiava. Queria que eu me sacrificasse. Queria que eu deixasse meu presente pra trás, meus amigos, minha família, minhas paixões. Isso eu não poderia jamais. Então, tratei logo de encontrar outro canto quase confortável pra sentar.

Eu poderia ficar ali o tempo que eu desejasse. Eu saberia o caminho da volta, tendo como referência a praça. Eu sabia que eu logo voltaria. Estava começando a ficar meio encabulada no meio de toda aquela natureza. Sim, querendo ou não, eu era uma intrusa no ambiente e me sentia cada vez mais envergonhada cada vez que avistava uma garrafa de plástico seca ou embalagem esvoaçante no meio do caminho das pedras, dos matos, do rio. Eu sei que não foi eu, mas a Mãe Natureza pode ter pensado: "Ela também é um deles, um desses humanos destrutivos." Eu era, então, uma ameaça. Ué, será que Ela não notou que mantive minha garrafa d'água na mão, mesmo completamente seca em grande parte do percurso, e que não haveria cristão no mundo que me convencesse a largar o plástico naquele verde tão lindo?

A vegetação crescida estava tão arredia comigo. A planta quase atingiu em cheio meu tornozelo com seus espinhos. A sorte para os meus pés foram os tênis super protetores. Felizmente, o saldo final dos incidentes foram só alguns carrapichos grudados e obstinados a continuarem agarrados aos cadarços dos meus tênis. Apenas isso, nenhum arranhão, - é que a Natureza não é vingativa como o homem, ela apenas reage pra sobreviver, não é vingança não.

Eu decidi retornar. Já não cabia em mim de tamanha vergonha por conta da invasão do lixo ali. E quando voltei, logo notei que já fazia falta. Era minha mãe na praça, perguntando : " - Por onde você andava, menina? Achei que tinha se perdido!" Mas não, não me perdi não. Na verdade, me encontrei na aventura daquela caminhada, no roçar do mato alto, no dosar de cada pegada minha marcada naquele espaço.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Na gaveta mais bonita do coração.



Eu posso não ter uma memória muito confiável, mas a imagem ao vivo e a cores, à vida e aos amores, que registrei hoje, já guardei a sete chaves na gaveta mais bonita que tem o meu coração.

Eu não sei nomes, nem idade, nem o desenho do rosto da pequena, mas havia hoje, no ônibus, sentados lado a lado nas cadeiras preferenciais, um senhor tão lindo, com cara de vovô, a brincar com a bebê encaixada no colo de sua mamãe.

Ele fazia cócegas na mão pequena e depois no joelhinho dela. Tive a sensação de que não se conheciam, mas havia naquilo uma afetividade de outros tempos. Mais parecia que ele se encontrava, sem espelho no meio, com ele mesmo quando bem pequenino. E aquele reencontro não lhe causava nenhum arrependimento. Não sentia nem mesmo vontade de voltar no tempo. Como se todas as lágrimas, as dádivas, os encontros, as rupturas, tivessem valido, sim, uma vida inteira; com ruga e sem fuga de quem foi e de quem pode ainda vir a ser.

sábado, 15 de outubro de 2011

Causa da morte: Gula

Qualquer dia desses, morro pela boca, certeza!

Eu sei que educado e chic é comer pouco. Mas, por que, se comer não é só uma necessidade, é entretenimento também?! Uma porção de restaurantes se concentram e ao mesmo tempo se espalham pela cidade. O vento se transforma numa mão flutuante, com um dedão indicador soprando e dizendo: "- Venha...Venha!"

Não sei o seu, mas o meu prato fica sempre vazio depois do almoço e do jantar. Minha mãe sempre diz: "- Se não como `comida de panela`, nem parece que comi." Eu herdei essa sensação dela. Não culpa dela, mas culpa minha esse inchaço permanente no estômago. Antigamente, a bolinha na barriga era passageira; surgia assim que eu devorava o prato. Hoje, não, o buchinho fica me lembrando que está ali 24 horas. Buchinho não, a verdade nua e crua é que aos 23 anos virei menina do buchão. E não são vermes. Cruzes! Tomara que não! Nem gravidez, Cruzes outra vez! Também não é chope, nem cerveja, nem líquido durante as refeições, nem refrigerantes - Coca, Kuat, Fanta, fiz questão de exterminá-los de vez dos meus hábitos alimentares. Tanto, que hoje tenho orgulho de sempre ter que repetir: "- Refrigerante? Só pra ele, não tomo refrigerantes!" E a pessoa diz: "- Que saudável você é! Me diz, há quanto tempo?" E respondo com satisfação: "- Há 2 anos!!"

Já cansei de buscar soluções para a minha protuberância no abdómen; uma pena eu não cansar de me divertir à noite. Meu lazer é assaltar a geladeira; é que preciso alegrar minha semana. Infelizmente, tenho que encarar o fato de que, quanto maior o cansaço, mais monstruoso é o meu apetite. Às vezes, tenho a impressão de que meu buchão vai explodir a qualquer momento. Felizmente, o máximo que acontece é sentir que estou forçando minhas vértebras.

A sorte é que não tenho coragem de viver uma cena clichê de filme de comédia romântica, em que a mocinha sofre uma desilusão amorosa e se agarra ao pote de sorvete de frente pra TV. Puxa, seria o fim pra mim. Fico imaginando o médico constatando: "- É, essa aqui morreu pela boca! Não de falar muito, mas de comer tanto".

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Das 5:20 A.M às 8:00 A.M

Definitivamente, eu não sou a melhor pessoa do mundo entre 5:20 A.M e 8:00 A.M! Sim, eu sou a pessoa mais chata do mundo, principalmente na Academia de manhã cedo. Não que me desagrade o ato de malhar, gosto muito, aliás, só não consigo reagir numa tentativa de comunicação cedinho da matina.

Não, eu não faço amizades em Academia e não consigo me colocar no lugar dos falantes de Academia para compreender o que os leva a isso. Nem faz sentido. Veja bem, Academia é sinônimo de exercício físico, e não linguístico. É um local para exercitar o corpo, e a mente também! Tudo bem que penso em muitas abobrinhas enquanto faço aqueles exercícios repetidamente, mas também penso na vida, no universo e em tudo o mais ( vi essa expressão na trilogia do "Guia do Mochileiro da Galáxia" e gostei tanto, que resolvi me apropriar dela).

Então, fico feliz de não ter amigos na Academia. Ora, se nem com meu pai, que é meu pai querido demais, eu me arrisco trocar mais que meia palavra àquela hora da manhã, imagine bater altos papos com um estranho ou estranha na Academia?!

Para fugir da cilada de ter de falar em um momento no qual ainda nem acordei, - andando por aí feito uma sonâmbula, feito uma zumbi, feito um corpo desalmado, enfim, feito qualquer coisa que não pareça um ser vivo em seu estado normal - entupo minhas orelhas com boa música estourando nos fones. Só sinto pelos pobres fones a tremerem diante do meu exagero de apreço ao álbum selecionado.

Ah, e como esses meus fones são mágicos! Não sei como eles adquiriram um poder de transportar a gente para um mundo alternativo. Sinto-me dentro de um clipe, ou sobre um grande palco de um maior festival de música do Mundo. É aí que percebo que não estou tão morta-viva quanto imagino toda vez que caio da cama com pavor do despertador. Sabe, acho que daria um prêmio daqueles pra quem teve essa brilhante ideia de um trocinho tão pequeno, poder armazenar tanta música preferida.

Sim, pois, voltando ao delicado assunto de ser ou não uma pessoa amigável logo de manhã bem cedo, eu não tenho amigos na Academia, porque eu não sou mesmo a melhor pessoa do mundo para ficar desejando repetidas vezes "bom dias" sinceros.

E, caso alguém tente estabelecer contato, mesmo que um breve contato comigo, então sou praticamente coagida pela educação ensinada pela mamãe e pelo papai a responder "Bom dia! - ( sorrisinho)". Mas não, eu não consigo. É uma força maior que eu que me impede de agir assim. Então eu respondo: " - bom di..." ( sem sorrisinho, só a boca entreaberta) " O bom dia que sai de mim é pronunciado numa versão preguiçosa e antipática, quase a contragosto, quase impossível de ser captado pela audição de meu interlocutor solitário neste medíocre processo de comunicação.

Depois de pensar bastante em como me tornar uma pessoa melhor, concluo que não dá. Não é de mim isso de ser a pessoa mais simpática da Terra das 5:20 às 8:00 A.M.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Mulher de homem de Agência

Agência de comunicação, é esta a qual me refiro. A princípio, nem parece tão polêmico assim; mas, claro, se tem o lado ruim, também tem o lado bom.

Você vai se cansar de estar tanto com seu "eu". Sério, até certo ponto você ainda pode se aturar, mas depois, até o grilo "grilando" lá fora e o grilo da sua caixola te irritarão profundamente. É, posso estar exagerando, mas a Mulher de um homem de Agência pode se transformar mesmo numa Mulher grilada.

Você vai pensar um monte de bobagens e chegar ao ponto de decretar com veemência: - " Não, isso não é vida. Procure outro job." Não job de job (pedido de criação), e sim job de Trabalho mesmo, sabe!? Aquele Trabalho que você dá o gás da hora tal à hora tal e ponto - bate o ponto -, nem 8 horas a mais, nem 8 horas a menos.

É, isso seria um sonho em plena vida real.

O jantar seria devorado ainda quentinho; a cama estaria sempre com aspecto de que ali passou um tufão; os móveis da casa estariam repletos de roupas penduradas; os filhos nem estariam mais cobrando um muito de atenção; você saberia mais sobre a vida do seu homem de Agência, e o mais importante: você se habituaria mais com os hábitos do seu homem de Agência. Acho até que a respiração alta dele nem te incomodaria tanto, nem as manias inusitadas.

Mas como uma boa Mulher de homem de Agência, você também deve "pensar fora da caixa" e enxergar o lado positivo das coisas.

Enquanto seu homem de Agência AINDA está na DROGA da Agência, você está ali consigo mesma (até certo ponto, reafirmo), lendo um bom livro, ou numa mesa de bar com os amigos, ou conversando bobagens no Gtalk, ou interagindo com a natureza numa caminhada, ou, ou, entre muitos ous de possibilidades.

Separação.


Quando criança, não entendia o tamanho egoísmo ao se domesticar um pássaro. É como guardar um ursinho de pelúcia solitário na estante, pra brincar com ele de vez em quando e nada mais.

Hoje sei e posso contestar qualquer decisão de alguém próximo que envolva a privação da libedade de uma espécie. Eu sei que é difícil, por isso mesmo estou colhendo forças para me separar do meu pequeno amigo, mais conhecido como periquito da caatinga, adquirido por minha mãe quando eu ainda não tinha consciência pra impedir aquela "troca".

Por favor, não comprem mais pássaros; é como sufocar a liberdade e aprisioná-la numa gaiola cheia de ferrugem.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Meu primeiro voo


Antigamente para mim, avião era só uma estrela vermelha pulsante no ceú. Talvez seja a mesma percepção que os bebêzinhos têm ao seguir com o olhar a direção que aponta o indicador da mamãe, que insiste em mostrar aquilo como distração para calar o choro.

Hoje sei que aquele objeto, resultado da capacidade humana de transformar as coisas, não é apenas um ponto de luz distante. Estive perto, muito perto. Estive nele, naquela coisa imensa e voadora.

Foram quase as quatro horas da viagem inteira, observando com a curiosidade de olhos pueris todo o espetáculo de azul e nuvens. Acho que, se existisse alguém com os super poderes de um Super Homem voando por ali, veria só uma cabecinha grudada na janela da asa direita, atenta a tudo, a todos os "algodões" flutuantes, a todas as "maquetes" de cidades desconhecidas, a todas as luzes da noite - amarelas ou brancas.