domingo, 16 de março de 2014

Não há vergonha em começar do zero

Por elainepacheco, também publicado em twentyweeks.com/
Se não foi desta vez o que tanto queríamos, o tal sonho, se este não passou de um castelinho de areia, o jeito é recomeçar reconstruindo-o.
A praia foi uma sala de aula despojada. Enquanto conversávamos “papo-cabeça” de gente que só quer ser grande mas não é, o nosso pequeno professor Arthur, inquieto, tentava construir o seu castelinho de areia. Um só, não. Vários.
Ao alcance de suas minúsculas mãozinhas estavam suas ferramentas: o balde, a pá, uma espécie de peneira de areia e outros que não consigo detalhar, porque me perdi no sorriso típico de criança, aquele bem acompanhado de brilho no olhar e de olhinhos redondos quase fechando.
Há uma maleta de plástico para guardar todas essas ferramentas, da qual o pequeno não tira o olho se você gentilmente se oferecer para carregá-la. O menino, esperto que só ele, sabe tomar de conta de sua preciosidade. Inclina de leve a cabeça pro lado, na direção onde está sua mão que leva os brinquedos. Vai que você, adulto cabeça de vento, larga em algum canto e esquece, né.
Ele mantém sua vigília firme e forte até escolhermos uma barraca e uma mesa. Daí começa a atuar a engenharia do pequeno na minha mente que vê metáfora em qualquer coisa ao redor.
Primeiro, ele tenta construir o Castelo num canto nada óbvio: a nossa mesa. Sua mãe só podia alertá-lo que ali não era a base ideal pra esse tipo de construção. Teria que ser na própria areia da praia.
Ele resolveu aceitar a orientação sensata da mãe e sentou próximo da gente, onde as ondas do mar ainda não haviam tocado os grãos de areia. Ficou ali sem saber por onde começar até pedir ajuda.
Sem cerimônias, a mãe afunda as mãos na areia e vai formando um pequeno monte no formato de um vulcão. Ele observa e imita. Libera sem cautela a areia que traz apertada dentro da palma da mão. Joga-a ao vento num surto de risadas.
Assim, seu castelinho de areia vai ficando cada vez menos parecido com castelo. Para ele, virou um bolo de aniversário. Colocou um galho no ápice do monte, fazendo de conta que era uma velinha, e cantou “parabéns”.
Feita a festa, o aniversariante olha pra gente com cara de sapeca e se joga no bolo de areia. Mergulha de barriga no que era pra ser um castelo de areia. Sai destruindo tudo movido por uma gargalhada que há muito tempo eu não ouvia. Isso enquanto escuta a gente se lamentando: “-Mas você destruiu o castelo! Vai ter que fazer tudo de novo”
Depois da farra demolidora, o menino parece reconhecer a necessidade de reconstruir aquilo que se foi e afirma com manha: “- Eu não consigo” E eu digo, sem pensar duas vezes: “- Claro que consegue! É só fazer de novo!”

E assim ele fez. Fez e refez, refez e fez o bolo de aniversário, porque criança sabe celebrar a vida todo dia. É assim que precisa ser. Todo dia, uma nova conquista feita com nossas próprias mãos.
Se não foi desta vez o que tanto queríamos, o tal sonho, se este não passou de um castelinho de areia, o jeito é recomeçar reconstruindo-o.

Não há vergonha alguma em começar do zero. Se bem que não existe isso de reiniciar do zero. Afinal, das tentativas anteriores, muitos aprendizados ficaram.

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