quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Pombos com toda pompa



Tenho quase certeza de que os pombos guardam segredos sombrios dentro de seus papos salientes. Estufam o peito e passam a nossa frente. Outro dia precisei frear bruscamente. Esperei o pombo desfilar pelo asfalto esburacado com toda sua pompa. Andou com elegância o ícone da paz e também da doença, por isso também conhecido como “ rato de asas”. Para mim, mais parecem mistérios de asas com sangue nos olhos; já encarei-os e, de fato, circunda em seus olhos uma névoa avermelhada que confere ao seu olhar algo um tanto vampírico.

Eu continuava aguardando com toda paciência do mundo o pombo atravessar a avenida. Eu sabia que um de nós teria de ceder, e esse um era eu, que não representava ameaça alguma para ele. Mostrava-me sua posição de o Sr. da rua, não só da rua, aliás, do país, do planeta. Tenho quase certeza de que falta pouco para os pombos dominarem o mundo. E o pombo que apareceu no meio do meu caminho era o representante, um dos líderes da revolucionária superpopulação de pombos moradores de praças e igrejas.


Eu seguia com movimento ocular o seu andar dançante. O pescoço, povoado por penas azuis de tão negras, se estica, em seguida, recua deslizando no ar com o mesmo impulso. Parece até que decidiram ter esse tipo de andar pra zombar da gente: “Olha só a dancinha de calango que sou capaz de fazer .” Dança com o pescoço de um calango o danado. Com isso, ostenta sua habilidade observadora e furtiva. Finalmente, completou o seu trajeto e eu pude prosseguir o meu.

No outro dia, despertei de um sonho esquisito. Aqueles sonhos em cujos episódios nos perdemos e a única certeza são as sensações mais que físicas, que atravessam a pele e passam a ser sentidas também pelo nosso espírito. Aqueles sonhos em que sentimos necessidades tão fortes, a ponto de despertarmos com elas e descobrirmos que são reais.

Eu dormia no meu quarto, mas este não era mais parte da minha casa. Localizava-se agora no centro de uma praça qualquer. Era dia e os ventos anunciavam uma tempestade. Eu rolava de um lado pro outro na cama, não em busca de uma posição favorável para adormecer, mas tentando fugir de um pesadelo como muitas vezes faço: diante da ameaça de morte, simplesmente fecho os olhos, pronunciando mentalmente “vou sair daqui, vou sair daqui”, e me teletransporto, me refugio na realidade que só meu quarto é capaz de me proporcionar; nele sou inatingível, quase imortal. Meio insano se sentir imortal num mundo real, onde conseguimos ser os seres mais mortais da face da terra.

No pesadelo, o céu de nuvens tinha se transformado num céu de pombos, muitos, muitos pombos, uma intensa concentração de “ratos” voadores. Suas fezes banhavam meu corpo inteiro; eu me sentia muito imunda. Estava tão suja, que só pensava em me lavar com álcool, pois água não seria suficiente. Doenças transmitidas por pombos se espalhavam célula por célula no meu corpo. Eu estava contaminada, morte sentenciada.

Mas consegui, me utilizando do meu super poder de teletransporte, acordar na minha querida realidade da qual tanto reclamo às vezes. Não reclamo mais; minha vida é um mar de rosas e devo agradecer todo santo dia por isso.

Não sei se por telepatia, mas no mesmo dia desse terrível pesadelo, quando, nesse nosso confortável mundinho real, já planejava escrever aqui uma história sobre pombos, um amigo propôs que eu postasse uma crônica sobre o pombo viciado em fast-food, especificamente em “Burguer King”. Ele flagrou três vezes um pombo se deliciando com as batatas fritas de um desses Burguers Kings.

Então, esses pombos não são tão espertos assim, pois li que em estado selvagem eles podem viver até 15 anos, porém, nas cidades, com um cardápio nada saudável, não passam de 5 anos de vida. Não que eu esteja desejando o mal a eles, mas que isso pode ajudar no controle de natalidade, isso pode.

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