Você nasceu no raso do vasinho de barro e, mesmo naquele vazio, você decidiu resistir. Suas folhinhas secavam,embora tivesse muita água na telha ou na torneira. Encontrava-se em ambiente fechado: às vezes escuro, mais vezes claro. Mas a luz era um tanto esquisita. Tinha certeza que esta não vinha emitida da pequena bolinha de fogo amarelo-branco no céu. Algumas vezes pôde sentí-la enquanto estava sendo "criada".Logo ficou pronta para ser vendida no supermercado.Era como um filhotinho de cachorro, esperando ser comprada por alguém com sensibilidade aflorada.
Ali, sentia tanta ausência. Faltava no ar a dancinha do vento que faria suas múltiplas "mãozinhas", tão murchas, bailarem junto. Faltava o carinho de gotinhas cristalinas deslizando sobre sua superfície. Diante de tamanha carência, percebeu que não lhe faltava esperança e persistência: contemplou seu próprio pedacinho, uma réplica minúscula, crescendo pacientemente a cada dia no canto do seu braço-galho exausto.
Outro dia, um grande dia, alguém não a rejeitou ao ver suas flores tristes, o que era um evidente contraste em relação às outras que chegaram há pouco ainda muito vistosas. Então, mãos pequeninas aproximaram-se para regá-la. Das pontinhas dos dedos redondos de alguma menininha que passava ali, pingaram gotinhas. Caíram sobre suas flores desbotadas, que em poucos instantes recuperaram a vida. Foi transportada pela aquela pessoinha e posta na esteira do Caixa, na qual observou uma troca. Viu na tela da máquina poucos números depois de uma sigla assim: R$. Como uma mercadoria qualquer foi enfiada, com um toque frio da moça do Caixa, dentro de um saco plástico.
A menininha a levou para um lugar onde havia outras plantas. De repente, viu-se fora do vaso. Acompanhada de adubo, muita terra úmida e outras semelhantes a ela,sentiu as mãos da menina em conchinha, diagnosticando o que estava morto em seu corpo para podar. E assim,voltou a ser tão completa quanto uma paisagem.
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