quinta-feira, 25 de junho de 2009

Risco alheio - trecho de "Frei Joe".


" Os anos 50 chegavam ao fim, fazendo grande alarde. A Grã-Bretanha estava quebrada, mas despontavam indicações de um novo sistema que faria com que achássemos que precisávamos de bens materiais dos quais, na verdade, não precisávamos, a despeito de termos ou não condições financeiras para adquiri-los. Tudo parecia muito empolgante. E o que era ainda mais empolgante, a economia voltada para adolescentes começava a decolar, por meio de roupas, cosméticos, filmes, música. Os produtos destinados a tal segmento, de modo geral, eram importados dos Estados Unidos, ou, se produzidos na Grã-Bretanha, eram concebidos e vendidos segundo modelos norte-americanos. Pela primeira vez, abriu-se um abismo entre as gerações, permitindo aos novos especialistas em marketing, formados no estilo norte-americano, pôr em prática, com clareza, a primeira tentativa de manipulação de consumidores, em âmbito nacional.

...

Mais significativo era o fato de eu me ver fascinado com o processo pelo qual artigos eram vendidos, com a publicidade e o marketing, - especialmente na televisão-, atividades que pareciam ao mesmo tempo moralmente perniciosas e brilhantes, em termos de criatividade. Pedi a orientação de Frei Joe acerca de bens materiais.

...


A análise feita pelo frade da natureza da propriedade privada era muito mais sagaz.O verdadeiro alvo do especialista em marketing, afinal, é o eu. O eu é o início e o fim da venda.'Este produto vai fazer o seu eu avançar no mundo.' 'Quanto mais você possuir excelentes produtos como este,mais poderoso será o seu eu'. E, obviamente, mais barreiras você terá estabelecido ao contato aberto e direto com o outro. Comprar até ficar exausto e amar verdadeiramente talvez sejam práticas excludentes.

Frei Joe enfatizou que sua análise não propunha que fosse errado possuir bens, tampouco condenava a satisfação derivada da posse de bens. O que remetia ao velho princípio: contemptus mundi não significava desprezo pelo mundo, mas distanceamento do mundo.

- Tudo depende de como os b-b-bens são encarados, meu caro, e as satisfações por eles geradas; é preciso ser capaz de abrir mão dos bens, sem qualquer arrependimento."


TONY HENDRA, Frei Joe - O homem que salvou minha alma- pags: 166, 168 e 169.

Nenhum comentário: